Performance da obra de Marina Lima e Antonio Cicero vira tema de pesquisa

Estudo destaca questões políticas, de gênero e mercadológicas no pop rock dos anos 80

Cantora Marina Lima. Foto: Reprodução Facebook da Cantora

Por Catarina Silva Ferreira – catarina.ferreirasilvs@gmail.com

Durante a década de 1980 o país passou por muitas mudanças. A principal delas foi o processo de transição democrática. O contexto político e econômico nacional se tornou o pano de fundo da produção cultural de muitos artistas, as canções interpretadas pela cantora Marina Lima compostas em parceria com seu irmão Antonio Cicero são um exemplo disso.

Abordando a fugacidade das relações humanas, a obra dos irmãos destaca-se ainda hoje, pois ao mesmo tempo que é destinada ao mercado como produto de consumo é também detentora de uma elaboração estética refinada. Fato que chamou atenção de Renato Gonçalves Ferreira Filho, mestrando do Instituto de Estudos Brasileiros da Universidade de São Paulo.

A dificuldade de enquadrar a obra de Marina Lima como pop rock ou como MPB foi um dos fatores que o mestrando analisou em sua dissertação. Além disso, a performance da cantora enquanto mulher e o discurso de gênero na obra dos irmãos também chamaram sua atenção.

Em sua dissertação o pesquisador afirma que, entre tantas outras canções Fullgás se destacou por seu enredo leve e por ter se tornado referência na música nacional. A maior parte da canção trata de amor, sua estrutura é corrida sem refrão ou repetições frequentes. A única frase que se repete é ”Você me abre seus braços/ E a gente faz um país” justamente a que quebra a concepção de que a música trata somente do amor entre eu-lírico e objeto. A canção parte da relação dos dois amantes e chega a um contexto maior, o país, e essa referência é ressaltada pela repetição do verso.

A respeito da composição de Marina e Antônio, Renato Gonçalves conta que “Eles tinham uma crença numa política de pessoa física, que buscava de alguma forma apagar as marcas que a estrutura social deixa no corpo. ”. A postura deles ressalta a importância de ser um “Cidadão do Mundo” e dialoga com o “fazer um país” que é citado em Fullgás. Ao mesmo tempo que a obra exalta essa individualidade na concepção da mudança também capta a efemeridade desse processo, que segundo o mestrando se relaciona com o título da música.

“Eles tinham um discurso de libertação dos gostos pessoais, e isso se relaciona tanto com a política quanto com sexualidade, presente na questão de gênero evocada por Marina em suas performances” destaca o mestrando ao analisar o posicionamento político dos irmãos. A cantora foi protagonista de suas próprias canções, postura inovadora para o pop rock nacional mas que dialoga bem com a MPB, grande palco do protagonismo feminino na indústria fonográfica.

A respeito disso, Ferreira Filho cita a interpretação de Marina Lima da música Mesmo que seja eu de Erasmo Carlos, na qual, o discurso romântico do eu-lírico é claramente masculino e direcionado a outra mulher.  ”Você precisa de um homem pra chamar de seu/ Mesmo que esse homem seja eu”. Quando interpretada na voz de Marina a música ganha também caráter de contestação do lugar comum dos gêneros nas músicas populares.

A dissertação de Renato Ferreira busca analisar o “pop refinado” das canções da dupla, e explorar a maneira como tratam de questões maiores e mais abrangentes relacionando esses temas com aquilo que é mercadológico.

Ao explorar o tema da representatividade e o papel dos gêneros em meio às canções, o mestrando sentiu a necessidade de se aprofundar no tema o que o levou a escrever o livro Nós Duas – Representações LGBT na canção brasileira. A obra, com apoio do Programa de Ação Cultural do Estado de São Paulo (ProAC 26/2015), aborda o pioneirismo de artistas que assumem um posicionamento LGBT em suas músicas e traça uma espécie de panorama que vai do início da década de 1970 até os dias atuais.

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