Desigualdade regional brasileira pouco mudou na primeira década do século 21

Essa é a conclusão de pesquisador da FFLCH, cuja tese de doutorado abordou as disparidades produtivas do território nacional

Descentralização precisa passar por políticas públicas construídas de baixo para cima. Foto: geledes.org.br/Reprodução

Por Marcos Hermanson Pomar – marcoshpomar@gmail

O Brasil é um país muito desigual. Da maior floresta tropical do planeta, na região Norte, aos pampas da região Sul, as diferenças não se resumem apenas à biologia, à densidade populacional e à qualidade de vida, mas também à estrutura produtiva. Já há mais de um século, quando o eixo econômico se transportou dos canaviais nordestinos para os cafezais do Sudeste que os estados dessa região e, em menor, escala, os do Sul, concentram as nossas indústrias, principalmente as de maior dinamismo econômico, e detém boa parte da produção fabril brasileira.

Esse quadro mudou pouco no período de 1999 a 2010, quando houve um ciclo de notável crescimento econômico, capitaneado principalmente pelo governo Lula (2003-2010), mas, com bases no segundo mandato de Fernando Henrique Cardoso (1999-2002). É o que nos conta Alexandre Abdal, pesquisador do Departamento de Sociologia da FFLCH (Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas) e professor do curso de Administração Pública da FGV, que dedicou sua tese de doutorado ao tema.

“Não há histórico, no século 20, de deslocamento do eixo estrutural de localização da indústria brasileira, e a situação não mudou na última década. Grosso modo, podemos dizer que a maior parte de nosso setor manufatureiro se encontra ainda no espaço conhecido como Polígono Industrial, que abarca Sudeste e Sul, e ainda assim de uma forma desigual dentro dessas regiões”, explica.

Ele ressalta, no entanto, que a desconcentração, assim como o crescimento econômico, não é, necessariamente, sinônimo de desenvolvimento e melhoria de vida para as populações afetadas: “Em primeiro lugar, é preciso questionar o modelo de descentralização adotado hoje, porque aposta na guerra-fiscal, o que limita o poder do estado de investir suas arrecadações em políticas de bem-estar social e gera perdas a nível nacional”, argumenta. “Além disso, o que vemos é que a instalação de indústrias em regiões de escassa produção fabril não significou a distribuição da riqueza gerada, o que agrava alguns males já vistos nos grandes centros, como a violência e a criminalidade, a precariedade urbana e a insuficiência dos serviços públicos”.

Para Alexandre, a descentralização precisa passar por políticas públicas construídas de baixo para cima e, além disso, levar em conta a competitividade, as fontes de dinamismo de cada setor e região e as ações específicas que se deve levar a cabo em cada região, tendo como objetivo a distribuição dos recursos obtidos entre a população e, em última análise, a redução das desigualdades. “O problema é que isso passa pelo enfrentamento das oligarquias e das elites políticas regionais, cujos interesses não se alinham com esses objetivos, e essa não é uma tarefa fácil”.

“Durante o período de intenso crescimento econômico dos anos de 1999 a 2010, meu objeto de estudo na tese, pudemos destacar um crescimento, ou expansão, do polígono industrial, mas não um movimento de  descentralização do desenvolvimento pelo território nacional”, diz Alexandre. “No começo do governo Lula, quando da criação do Ministério da Integração Nacional, desenvolveu-se um plano ambicioso cujo objetivo era esse. Mas pelo financiamento escasso, problemas institucionais e de prestígio da política e pela mudança de lideranças na pasta o seu alcance foi muito limitado”.

Ao pedir para que o pesquisador fizesse uma previsão a respeito do futuro das desigualdades regionais e da superação de nossa dependência crônica, recebemos uma resposta não muito animadora: “Toda a conclusão do meu trabalho se centra na ideia de que a construção de um país equânime passa pela redução das desigualdades regionais, tão afloradas no Brasil. Mas o que constatei é que elas não diminuíram durante os primeiros dez anos do século, e as perspectivas é que não diminuam tão breve”. E continua: “Pelo contrário, o atual governo não eleito e as elites econômicas e políticas que o sustentam já deram sinais de que a redução das desigualdades e a superação de nossa dependência produtiva e tecnológica não estão na ordem do dia; e que de pretendem dar mais autonomia ao mercado que, trabalhando sozinho, tende a manter ou aumentar a concentração e as desigualdades”.

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