Falta de segurança compromete saúde de trabalhadores extrativistas

Sem equipagem adequada, coletores se expõem diretamente aos perigos da atividade. Imagem: Portal do Amazonas

Uma pesquisa publicada na revista Saúde e Sociedade buscou avaliar a atual situação do trabalho extrativista de coletores de sementes e frutos oleaginosos na região norte do Brasil. Como resultado dessa avaliação, foi percebido um baixo uso de equipamentos de proteção por parte dos trabalhadores.

Realizado a partir de uma parceria entre a School of International and Public Affairs da Universidade de Columbia, a Escola Politécnica e o Instituto de Relações Internacionais da USP, o estudo incluiu uma etapa destinada à visita de campo. Durante um mês, um grupo de pesquisadores acompanhou a rotina dos trabalhadores nas áreas rurais das cidades de Salvaterra e Bragança, ambas localizadas no estado do Pará e importantes pólos de extração de sementes como andiroba, murumuru e pracaxi. Entre seus objetivos estava a investigação dos padrões de Saúde e Segurança no Trabalho (SST) nessas localidades e da percepção dos próprios coletores acerca dos riscos envolvidos na atividade da coleta.

Vigorada em 2003, a Convenção 184 é um conjunto de 29 artigos estabelecidos pela Organização Internacional do Trabalho (OIT), que determinam padrões de SST para atividades agrícolas e florestais. Todavia, essa convenção não atende atividades de pequeno porte, excluindo já em sua segunda cláusula quaisquer práticas relacionadas à agricultura de subsistência, categoria na qual se encaixa o extrativismo exercido por pequenas comunidades. Além da falta de regulamentação por parte da OIT, há também uma carência de estudos que abordem especificamente a saúde e segurança nas coletas.

Tantas ausências contrastam com a atenção dada à extração em pequena escala dos Produtos Florestais Não Madeireiros (PFNMs), em geral muito valorizados por representarem meios alternativos de geração de renda e preservação de reservas florestais. Para João Paulo Candia Veiga, professor do IRI envolvido no estudo, as razões que justificam essa carência nos estudos e nas normas estão relacionadas ao surgimento recente desses tópicos no meio acadêmico brasileiro. Além disso, outro empecilho na formulação de regulamentações estaria nas formas de realizar as coletas, que não seguem um padrão por causa da grande diversidade de sementes.

Ao longo do período de visitação dos municípios, os pesquisadores entrevistaram 190 famílias pertencentes às comunidades extrativistas. Foram aplicados questionários que permitiram não apenas a compreensão dos pontos de vista desses trabalhadores a respeito do tema, mas também um ajuntamento de dados sobre a realização da atividade. Assim avaliaram-se aspectos particulares à coleta, tais como a posição corporal dos coletores, os locais onde são realizadas e possíveis perigos presentes nesses ambientes.

Devido a ausência de medidas reguladoras, optou-se por comparar as condições de trabalho extrativista com as situações ideais propostas por normas da SST em atividades gerais, adaptando-as conforme as necessidades do contexto e focando em três etapas: deslocamento dos coletores, coleta e transporte das sementes.

Os resultados obtidos apontaram que, apesar dos dois municípios apresentarem diferentes ambientes de trabalho, os trabalhadores estão expostos, sobretudo, a riscos físicos. Entre os perigos enfrentados estão o contato com animais peçonhentos, objetos cortantes e constante exposição ao sol. Somando-se a todos esses fatores, muitos não fazem uso de equipamentos de proteção, alegando tanto falta de costume quanto a sensação de que esses materiais se tornam obstáculos à coleta. “Alguns têm consciência, mas não querem usar por achar que isso atrapalha, que faz perder a sensibilidade [das mãos], ou, no caso das botas, que torna o andar muito pesado”, explica o professor Veiga.

Em paralelo a esse cenário, tem aumentado no Brasil a demanda por recursos naturais da região amazônica – especialmente por parte das indústrias de fármacos e cosméticos –, processo que é acompanhado de uma preocupação com a sustentabilidade no uso das matérias-primas, o manejo consciente das áreas de florestas e a inclusão social dos coletores. Por outro lado, há uma previsão de aumento do risco de acidentes na atividade extrativista, caso a falta de regulamentação se mantenha. Para os pesquisadores esse é, então, um momento fundamental para que se pense na implementação de normas exclusivas ao extrativismo, além de outros mecanismos que monitorem o uso de equipamentos de proteção nas comunidades.

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