Imigrantes contribuem para desenvolvimento de países de origem

Apoio dos que enviam recursos aos países de onde vêm é relevante para desenvolvimento local

Recursos são importantes para aumento da qualidade de vida da população / Imagem: Daniel Medina

El Salvador, país da América Central com 6.34 milhões de habitantes aproximadamente, possui cerca de 1/3 da sua população morando fora do país. Isso significa que há mais ou menos 2 milhões de salvadorenhos vivendo fora do território nacional. Após atravessar uma guerra civil, a diáspora populacional se consolidou e efetivou na década de 1990. Ana Figueroa é salvadorenha e realizou o doutorado no Instituto de Relações Internacionais da Universidade de São Paulo (IRI-USP), na qual se propôs a analisar quais eram os efeitos da saída populacional no desenvolvimento humano dos países da América Latina.

Partindo da inspiração tida pela experiência no país de origem, Figueroa queria entender se, e como, os imigrantes que deixavam seus países alteravam o desenvolvimento local uma vez que encontravam-se fora do país. A análise se pautou não apenas em termos financeiros, mas também se preocupou em trazer o lado humano dessa imigração, envolvendo aspectos culturais, sociais e políticos. Em outras palavras: como a qualidade de vida da população local se alterava da perspectiva migratória. “Muitos estudos se preocupam em analisar as remessas, o que é muito mais fácil de calcular e medir, os números já estão aí. Quando falo em migração, me proponho analisar os imigrantes em si. Eu decidi ir pelo outro lado e ver qual efeito tinha que a pessoa em si saísse, tendo um enfoque mais humano”, afirma.

Nesse sentido, uma das principais dificuldades esteve justamente relacionada a como fazer a análise quantitativa e mais humana dos dados, relacionando esses dois aspectos. Entre os imigrantes, Figueroa os dividiu em altamente qualificados e de qualificação baixa, para identificar diferenças quanto à contribuição deles no desenvolvimento humano de seus países. Os dados foram do Homeland Security, departamento de segurança dos Estados Unidos, contabilizando apenas imigrantes legalizados, com dados relacionados a profissão, quantos entram, renda e outros fatores. Avalia-se a qualificação desses imigrantes e a remessa que é enviada, com uma base de dados de 1970 a 2015.

Ao mesmo tempo, ao falar em relação a desenvolvimento humano, a pesquisadora se baseia nos critérios do Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento (PNUD), relacionados a: estilo de vida decente, vida longa e saudável e educação. “O que tentei ver foi como os imigrantes de alta qualificação, por exemplo, contribuem para a educação de seus países, ou que aqueles que estão em seus países tenham uma vida melhor, ou mais acesso à saúde, e como os outros, de baixa qualificação, afetam nisso também”.

Figueroa também destaca a outra variável utilizada, relacionada a essa abordagem mais humana. “Os números podem ficar curtos, então tentei ver pesquisas gerais [o Americas Barometer, base de dados com respostas a pesquisas realizadas em 18 países, dentre mais de 20 mil pessoas, conduzido pelo Latin America Public Opinion Project], vendo quais variáveis marcavam sobre educação, saúde, em seus países, por exemplo. Com perguntas como: você tem familiares fora do país? Se a resposta é sim, sei que posso ir com essa pessoa”.

Também ressalta para a divisão entre qualificação alta e baixa: “Uma das coisas que mais me surpreendeu foi que, apesar do que é comum pensar, nem sempre os altamente qualificados eram os que mais ajudavam em seus países”. Figueroa aponta para a ideia de que, por terem uma qualificação maior e muitas vezes maior renda, é comum que familiares desses imigrantes eventualmente se desloquem até o país em que se encontra o membro que saiu antes. Com relação à educação, por exemplo, alguns passam a investir em instituições internacionais e não nas do próprio país.

Isso se reverte para um quadro de menor ajuda e impacto no país de origem. Progressivamente, o envio de dinheiro por parte desses núcleos familiares deslocados por completo, passa a ser menor. O fenômeno, com os imigrantes de qualificação menor, é o oposto: em alguns casos, por exemplo, apenas um membro do núcleo familiar está fora, e todas as remessas que envia são investidas em seu país de origem pelos familiares que lá se encontram, o que se reverte em aumento de consumo nacional e melhora na qualidade de vida.

Para Ana, outra surpresa foi quanto ao direcionamento das remessas recebidas. Em relação aos imigrantes menos qualificados, verificou uma maior taxa de investimento educacional: “Algumas pessoas com as quais conversei diziam: Ok, eu sou pouco qualificado. Eu tive que fazer trabalhos que estadunidenses não querem fazer, e eu não quero que meus filhos tenham a mesma dificuldade com estudos”.

Para melhor explicar o assunto, a salvadorenha se baseou na teoria da Nova Economia de Migração: “O que ela vai dizer é que, eventualmente, toda essa ajuda dos imigrantes vai se espalhar pelo país como um todo”. O que se pauta é que: mesmo que um imigrante saia de um núcleo familiar, a ajuda não fica ali. Os investimentos da família são distribuídos a diversas áreas da economia (em vestimenta, comida, saúde, educação). Eventualmente, impacta no país como um todo. Ana aponta que o uso de dados macroeconômicos, apesar de tratar de quantias mais amplas, é útil para verificar esse fenômeno: “Essas ajudas são como pequenas injeções de capital que normalmente não seriam contabilizadas”.

A pesquisadora também relata que, em efeitos negativos, aqueles encontrados a curto prazo foram transformados em positivos a longo prazo. A ajuda de imigrantes de baixa qualificação se mostra mais perene em relação ao país. Para os altamente qualificados, essa ajuda diminui com o tempo, justamente pela ideia de que os recursos são direcionados, em sua maioria, ao país em que se encontram.

Em países como El Salvador, os imigrantes desempenham uma contribuição altamente importante na economia nacional, onde as remessas representam 15% da renda nacional. Esse valor se mostra influente não só na economia, mas em aspectos sociais e políticos. “Nem todas [as contribuições] são apenas financeiras, também adquirem novas ideias e valores, e isso é captado, internalizado e transmitido à família, essas são remessas sociais”. No caso de El Salvador, por exemplo, associações de imigrantes exercem grande influência no andamento das eleições, contribuindo financeiramente e também com ideias. Os imigrantes podem, de alguma forma, exercer um peso no cenário dos países de origem.

Em El Salvador, ⅓ da população mora fora do país, e investimentos por parte de imigrantes representam 15% da renda nacional / Imagem: Daniel Medina

Para Figueroa, um dos diferenciais do estudo está na avaliação dos imigrantes de baixa qualificação junto aos de alta qualificação, valorizando a percepção de que esses também ajudam não apenas nos países a que se dirigem, mas em seus países de origem, o que vai ao encontro do que comumente se costuma pensar.

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