Alunos de ensino médio aprendem na prática sobre sustentabilidade

Iniciativa propõe maior protagonismo dos estudantes estimulando o pensamento crítico

Estudante participando do projeto EpS. Fonte: Edson Grandisoli

Transformar o espaço através de teorias aprendidas em sala de aula. Essa é a ideia da iniciativa idealizada pelo pesquisador Edson Grandisoli. Dentro de um período de sete anos, uma escola particular da cidade de São Paulo implementou um sistema completo de gestão de resíduos, construiu um bicicletário e eliminou totalmente o uso de copinhos plásticos. Tudo isso feito por alunos de 1º e 2º ano do ensino médio, com tutoria de alguns professores.

O objetivo era que os estudantes aprendessem a pensar criticamente sobre ecologia e sustentabilidade, através da identificação de problemas na escola e a consequente busca por soluções. A iniciativa, que durou entre 2010 e 2016, tinha o nome de Educação para a Sustentabilidade (EpS). O trabalho virou tese de doutorado pelo Instituto de Energia e Ambiente da USP (IEE) e a metodologia aplicada tem o potencial de influenciar outras ações pedagógicas do tipo.

Quando criado, o projeto ainda não tinha uma didática própria. A iniciativa era tocada por quatro professores, sendo um deles Edson. Os encontros com os estudantes eram feitos toda quinta-feira. “No começo, fomos estudando e instrumentando muitas metodologias de trabalho com sustentabilidade”. Com o tempo, no entanto, uma didática foi estruturada a partir do conceito de pedagogia da sustentabilidade, termo utilizado para explicar a especificidade do ensino desse assunto. “Muitos artigos sugerem que para trabalhar com sustentabilidade é necessária uma pedagogia específica”, conta o professor

O termo já era conhecido no meio da educação, mas foi adaptado por Edson para esse exato contexto. A pedagogia da sustentabilidade busca incentivar o pensamento crítico sobre o tema, através do protagonismo do aluno, que recebe a tutoria do professor, e de uma maior relação entre teoria e prática. Para isso, a busca de parcerias e a capacidade de prever consequências estão entre as habilidades e ações estimuladas. O conceito foi utilizado como norte para as ações do projeto.

Descrição dos componentes-chave da pedagogia da sustentabilidade do Projeto EpS. Tabela retirada da pesquisa de Edson.

Um caso de sucesso

Apesar da grande maioria dos alunos permanecer por apenas um ano no EpS, as intervenções mais importantes tiveram continuidade. Um dos exemplos foi a implementação de um sistema completo de gestão de resíduos no colégio. Tudo feito e planejado pelos próprios estudantes, com a tutoria dos professores. Na compra das lixeiras, por exemplo, os alunos fizeram o orçamento, foram até as lojas escolher os modelos, contrataram uma empresa parceira para ajudar na logística dentro da escola e se reuniram com a equipe da limpeza a fim de entender sua rotina e treiná-los para o novo trabalho.

Ao todo, o processo durou três anos. “Essa, para mim, foi a mais difícil e a principal ação que fizemos. Hoje o colégio tem lixeiras espalhadas para coleta seletiva, com sinalização específica para cada uma.” Esse caso é interessante, porque mostra uma das principais características da iniciativa: mostrar aos estudantes aspectos mais sociais da sustentabilidade, como o contato com a comunidade ao redor. “No fundo só existe a questão ambiental por causa de questões sociais”.

Avaliação e reprodução

A forma de avaliar o crescimento de quem passou pela iniciativa é uma das novidades que a pesquisa de Edson carrega. Além das mudanças no espaço da escola, como a inserção das lixeiras, o pesquisador analisou também os resultados de seu projeto de outras duas formas não tão comuns na área.

No começo e no final de cada ano, os alunos respondiam um questionário sobre o que, para eles, eram temas de sustentabilidade. “No fim, normalmente eles valorizavam muito mais as questões sociais, como o comportamento das pessoas, fazer parcerias e a importância de influenciar seus pares”, explica Edson.

Além disso, alguns estudantes foram selecionados para o que o pesquisador chama de ‘análise de impactos’. “Quatro, cinco anos depois de passarem pelo projeto, sorteei alunos aleatoriamente e fiz algumas perguntas. Uma delas era “o que mais transformou você no projeto?” E a resposta mais frequente foi: eu me reconheço como agente de mudança da sociedade”. Com esse trabalho foi possível também perceber as marcas que o EpS deixou em quem participou. “Eu via que as respostas eram imediatas, mostrando o quanto teve impacto”.

Outra novidade é a análise tanto quantitativa quanto qualitativa dos resultados. “Na educação, muitas vezes para-se no qualitativo. Normalmente, o pesquisador pinça uma frase de um aluno, colocando como exemplo”.

Influenciando outros projetos

A grande importância de estudos de caso como esse é sua capacidade de influenciar projetos semelhantes. Para isso, o EpS enfrenta a mesma dificuldade que outros trabalhos sobre o tema. Iniciativas de sustentabilidade costumam depender muito do contexto em que estão inseridas. “Ele não é replicável exatamente como foi feito para outras situações”.

De acordo com Edson, uma contribuição fundamental do trabalho foi adaptar e utilizar a pedagogia da sustentabilidade como um guia. Depende, agora, de cada professor fazer as adaptações necessárias para seus contextos. “A pedagogia da sustentabilidade pode ser um norte também para outras escolas”.

A ideia e o final

A escola que recebeu o projeto era uma velha conhecida de Edson. O pesquisador tinha dado aulas de biologia durante oito anos no local. Em 2008, ele pediu licença para fazer um trabalho de dois anos na Amazônia. Quando retornou já não tinha mais interesse em lecionar. “O diretor da escola, sabendo dessa minha ligação com questões de meio ambiente e de sustentabilidade, me propôs a criação de uma iniciativa sobre o assunto”. Em 2010 a equipe do EpS foi montada, contendo mais duas professoras de química e uma de biologia.

De acordo com ele, um fator fundamental nesse processo foi a percepção da diretoria e coordenação quanto à importância dessas ações no crescimento dos jovens. Isso porque no ensino médio as escolas tendem a focar mais nos vestibulares. O pesquisador ressalta, por exemplo, a capacidade de trabalhar em grupo como um dos ganhos que o EpS leva aos participantes. “A quantidade de habilidades que esses alunos desenvolveram não só para o vestibular, mas para a vida é muito grande. As intervenções do projeto não são individuais, mas para a comunidade”.

O final da iniciativa, em 2016, deu-se por causa de uma reestruturação no colégio. Devido a questões internas, as turmas de optativa deveriam ser semestrais e não mais anuais. “Houve muita conversa entre nós, a direção e a coordenação. Como tínhamos conhecimentos dos resultados, dos efeitos e dos impactos alcançados, optamos por não abrir mão desse formato anual”, completa.

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