Copa do Mundo é utilizada como estratégia geopolítica

Boa parte dos últimos grandes eventos esportivos tiveram como sede algum país que compõe o Brics

Ex Presidenta Dilma Rousseff entrega a taça ao alemão Philipp Lahm na Copa de 2014 (Foto Folha de S.Paulo)

Uma pesquisa do Instituto de Estudos Avançados (IEA) da USP está investigando as táticas políticas existentes por trás do uso da Copa do Mundo por países que integram o grupo de cooperação Brics – fundado por Brasil, Rússia, Índia, China e África do Sul. Todos, países de economia emergente.

No projeto – Soft Power: Um Olhar sobre a Utilização Estratégica dos Brics ao Sediar a Copa do Mundo de Futebol da Fifa: Análise da África do Sul, Brasil e Rússia – o megaevento esportivo é estudado como estratégia de soft power, ou poder brando: maneiras amenas que um país possui de exercer domínio sobre os demais. “Os Estados Unidos, por exemplo, usam essa forma de poder por meio do cinema de Hollywood” explica Marco Bettine, professor da Escola de Artes, Ciências e Humanidades (EACH) e pesquisador que conduz a análise.

Ele explica também que eventos como a Copa do Mundo servem para mostrar o país, como uma vitrine: “Pesquisando em inglês ou espanhol, é possível ver o aumento no tráfego de busca pelo nome do país na internet. Aumenta 60% no mínimo, e o Brasil foi um dos que mais se beneficiou dessa questão”.

Por meio dessa vitrine, o País é capaz de incorporar seu soft power. Bettine esclarece que essa expressão, criada por Joseph Nye em 1990, afirma que as formas de poder mudaram após a queda do muro de Berlim. Para o autor, não é mais tão necessário demonstrar potência por meio de embargos econômicos ou poderio militar, por exemplo, pois o hard power, ou poder duro, tornou-se menos efetivo. É aí que as formas amenas de influência ganham força.

O professor discorda de Nye. Para ele, somente o soft power não é capaz de garantir influência de uma nação sobre as demais. Especialmente os países emergentes, haja vista a dificuldade que enfrentam para serem vistos como iguais pelas nações dominantes.

Ainda assim, “o soft power é uma forma de, ao menos, chamar a atenção do mundo para alguns aspectos culturais que envolvem os territórios, e com isso, conseguir algumas barganhas políticas, econômicas e culturais” observou Bettine.

Além de Joseph Nye, o docente está usando a imprensa internacional para entender o uso dos grandes eventos. Ele comentou que já havia questionado a maneira que a imprensa estava retratando o país brasileiro em 2014: “Eu queria ver como o mundo estava olhando para a Copa do Mundo, então a ideia do projeto partiu disso” afirmou.

Bettine optou por utilizar grandes jornais internacionais das línguas espanhola, inglesa e francesa como base referencial para a análise: “Decidi isso para não contaminar a pesquisa com o que eu já havia ouvido da imprensa local, brasileira”. Segundo ele, a escolha se deu também porque essas mídias, além de utilizarem as línguas mais faladas ao redor do mundo, ofereciam olhar crítico e grande conhecimento sobre as culturas dos países pesquisados.

As matérias escolhidas pertencem a portais online de jornais que já possuíam reputação no meio impresso. Le Monde, The Guardian e El País são exemplos das mídias utilizadas.

O docente está se surpreendendo com os resultados. No caso da análise de matérias sobre a Copa no Brasil, relatou: “Nunca ia imaginar que os jornais franceses veriam a importância da cultura brasileira na sociedade contemporânea, e a ignorância, descaso dos ingleses, e dos americanos preocupados com outros aspectos”.

O estudo faz parte do programa Ano Sabático, no qual os pesquisadores selecionados recebem uma bolsa com duração de um ano para desenvolver seu projeto.

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