Política ambiental brasileira prioriza declarações

Declarações ácidas entre representantes de governos fazem política ambiental mundial ficar em segundo lugar nas discussões 

Queimadas em agosto de 2019 (Imagem: Reprodução/Freepik)

O mês de agosto foi marcado por intensas discussões sobre queimadas na Amazônia. Segundo o Instituto de Pesquisas Espaciais (Inpe), dois em cada três focos de queimada registrados no mês ocorreram no bioma. Diante do aumento da importância da preservação mundial, o governo brasileiro sofre grandes críticas internacionais e suas metas ambientais são feridas. 

As queimadas são justificadas pela importância agropecuária, uma vez que haveriam mais espaços vazios para o desenvolvimento do setor. Jacques Marcovitch, professor do Instituto de Relações Internacionais (IRI-USP), comenta que tal conflito entre meio ambiente e agricultura já não faz mais sentido. 

Segundo ele, com uma agricultura mais sofisticada tecnologicamente, não é preciso ampliar a área agrícola para produzir mais alimento. Ao contrário: se a biodiversidade é preservada, tem-se uma produção agrícola cada vez mais competitiva e especializada. Espaço territorial já não faz tanta diferença diante do desenvolvimento tecnológico.

Acordos

Em 2015, o País ratificou o Acordo de Paris, um compromisso firmado com outros países para reduzir 37% as emissões de gases de efeito estufa até 2025, tendo como ponto de partida as emissões de 2005, e uma possível redução de 43% das emissões até 2030. Além disso, o outorgante se propõe a findar com o desmatamento ilegal e plantar 12 milhões de hectares.

“Em nenhum momento o Acordo de Paris firmado pelo Brasil vinculou, como outros países vincularam, a obtenção de recursos externos para viabilizar o projeto”, comenta Marcovitch. Sob autonomia nacional, o País conseguiria alcançar suas metas, e poderia aceitar ou não ajuda externa. Mas Ricardo Salles, atual Ministro do Meio Ambiente, declarou no fim de agosto a necessidade de uma ajuda internacional. Segundo ele,  “estamos preservando, mas precisamos ser remunerados por isso”.

O caso do Acordo de Paris não exclui cooperação financeira em outros projetos. Marcovitch conta que há recursos de ajuda internacional que podem ser chamados de filantropia, como recursos para acabar com os incêndios na Amazônia. “Isso é uma coisa que existe e existe, também, em outros países quando estão enfrentando uma crise.” 

O Fundo Amazônia é um exemplo dessa cooperação, e projetos como esse recomendam aprimoramento dos países. Um exemplo é a disposição da Noruega ao disponibilizar um bilhão de reais ao Fundo.  

O funcionamento de filantropia internacionais e o exemplo do Fundo Amazônia (Ilustração: Sofia Aguiar)

G7

Os incêndios na Amazônia entraram na pauta do encontro do G7, sediado na França, em agosto. Foram aprovados recursos para combater as queimadas na região, o que inclui também recursos disponibilizados à Colômbia, Bolívia, Peru e Equador. Como representante nacional, o presidente francês Emmanuel Macron foi o responsável pelo pronunciamento da decisão feita, mas gerou intensas trocas de faíscas entre ele e Jair Bolsonaro. Entre declarações de cunho pessoal e discursos políticos agressivos, tudo isso se tornou um teatro internacional.

Marcovitch classifica o episódio ácido como inconsequente. O que era para ser um tema e declaração oficiais, transformou-se em uma nova política, em que “agressões de palavras no Twitter vale mais que o posicionamento de um Estado–nação. Penso que estamos vivendo uma nova era que só conheci em momentos de grandes conflitos mundiais, como na Primeira e Segunda Guerras Mundiais”, declara o professor.

“As palavras têm enorme responsabilidade e temo que essa forma de se comunicar entre Estados, através de seus primeiros mandatários, tenham consequências negativas nas relações internacionais”. Vislumbra-se um futuro das relações internacionais que priorizam declarações mais do que documentos. Apesar delas não conseguirem desestabilizar e impor medidas, enfraquece a confiabilidade de um país. Para Marcovitch, deve-se questionar “o que é mais importante: acordos assinados entre países ou comentários de uma liderança eleita, mas que não nega muito bem suas palavras antes de se manifestar”.

Novos acordos

Nos últimos anos, o Brasil se esforçou para cumprir metas de desenvolvimento para pleitear a entrada em novos acordos, como a entrada na OCDE e solidificar relações com a União Europeia, pois seriam uma forma da potência sul-americana expandir sua economia. 

O tema Amazônia não é local, e sua repercussão fez todos aprenderem. Para Marcovitch, a questão ambiental não vai ser um fator para sua entrada ou não em associações. Como a OCDE é uma organização com foco econômico, juntar-se a ela é mais sobre disciplina e seguir determinadas regras. “Não há motivo para o Brasil não entrar na OCDE”. 

Já as relações com a União Europeia mostram-se mais subjetivas. A postura dos governantes está tomando proporções profundas e faz com que a opinião pública se enfraqueça. Tratados não vão ser analisados novamente, mas repercussões em mídias sociais e a conduta do atual governo sobre a Amazônia vão ser analisadas a longo prazo. Até então, observa-se um conflito entre racionalidade e emoção nas relações internacionais. 

Futuro

Reitera-se que países têm interesses políticos e econômicos. Macron visa se aproveitar da biodiversidade da Amazônia. A Noruega, por sua vez, em sua doação unilateral por dez anos de um bilhão de dólares, contando que haveria uma redução no desmatamento da floresta, possui interesse na interdependência entre a vazão do Rio Amazonas e a produção de pescados no País, geradora de emprego, renda e cultura, explica Marcovitch.

A ajuda do G7 em doações para combater incêndios é de interesse de todos. Na lógica de interdependência global, “fazer doações para acabar com incêndios na Amazônia é uma forma também de contribuir com o clima do planeta. Assim, o Brasil está recebendo recursos de doação para não só combater incêndios, mas para preservar o equilíbrio climático do planeta”.

Marcovitch é otimista sobre as metas do Acordo de Paris. Segundo ele, estudos comprovam que o Brasil vai conseguir alcançar suas metas. “Temos competência, recursos e um setor agro dinâmico a ser apoiado. Temos a necessidade de continuar cooperando. Precisamos colaborar e cooperar com os recursos vindos de países mais desenvolvidos”. Gerenciados como objetivos nacionais, serão corretamente recebidos e usados. 

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