Doações eleitorais pelo ponto de vista dos investidores

Pesquisa investiga os impactos da proibição de doações eleitorais provindas de pessoas jurídicas nas ações de empresas doadoras

Os dados da bolsa de valores podem indicar preferência por empresas doadoras. [Crédito: Thestreet.com]

Em época de eleições, os candidatos recorrem a todos os lados em busca de verba. Atualmente é possível conseguir fundos através de doação de pessoa física, autofinanciamento, fundo público de auxílio para as campanhas eleitorais (FEFC) e o recém-criado Fundo Partidário. Em 2011, uma decisão do Supremo Tribunal Federal tornou inconstitucional doação eleitoral por pessoas jurídicas. 

Em um estudo realizado na Faculdade de Economia, Contabilidade e Administração da USP (FEA), o pesquisador Marcus Vinicius da Silva Nunes buscou dados para avaliar os possíveis impactos da promulgação da lei que proíbe doações eleitorais provindas de empresas. O interesse pelo tema, partiu de uma curiosidade do autor em entender se as doadoras recebiam qualquer tipo de benefício como troca ao apoio financeiro. 

Buy or Sell?

Em 2011, o Supremo Tribunal Federal (STF) recebeu uma Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI) proposta pela Ordem dos Advogados do Brasil (OAB). Além de alegar que uma empresa não é uma pessoa e, portanto, não deveria ter direitos políticos, a OAB também alertou o STF sobre as diversas possibilidades de corrupção propiciadas pelas doações. “Supostamente as empresas que doavam saiam na frente em contratos públicos, a legislação tendia a ser mais favorável a seus interesses, recebiam informação privilegiada. Infelizmente, no Brasil, o céu é o limite para os benefícios para que se possa ter”, afirma Marcus.

Todo o trâmite do processo levou quatro anos. Para o pesquisador, esse período de tempo se tornou o melhor momento para avaliar se as empresas doadoras recebiam de fato algum tipo de benefício. “O ponto principal da minha pesquisa era analisar a percepção dos investidores da bolsa de valores sobre esse cenário. Porque supostamente, se o investidor entende que aquela doação de alguma forma é um benefício e que aquela conexão política vai rentabilizar de alguma forma, ele precifica isso na ação, ou seja, agrega mais valor.”

Com a possibilidade de coletar os dados do período em que se era permitido doar e do período em que se tornou inconstitucional, Marcus conseguiu o material necessário para fazer uma comparação. Desse modo, recolheu as informações de empresas que possuíam o capital aberto e que haviam feito algum tipo de doação entre os anos 2010 e 2014.  Algumas das selecionadas foram: Itáu, Bradesco, JBS e BRF.

Para sua análise, o pesquisador separou sete datas diferentes do processo. “Queria identificar o momento em que possivelmente teria acontecido o ajuste de preços. Período em que o investidor percebe que as empresas não podem mais doar e que esse talvez não seja mais um investimento rentável e com conexões políticas.” 

Linha do tempo do julgamento da ADI [Crédito: Marcus Vinícius da Silva Nunes]
No entanto, apenas no dia do ajuizamento da ADI o pesquisador obteve resultados significativos. As ações de todas as empresas sofreram queda naquele dia, mas para quem era doador foi menor. “Uma possível interpretação do ocorrido é de que o investidor de fato viu que isso era uma perda de valor das empresas, mas também sabia que por aquela instituição já ter doado recentemente, poderia ter algum benefício ainda por receber”, explica Marcus. 

O pesquisador acredita que os impactos deverão ser mais bem pontuados com o passar dos anos. “Confesso que não me parecia tão óbvio que a empresa que doava recebia um benefício momentâneo e isso acabou se comprovando”, completa. 

Adaptando-se a novas realidades 

Mesmo que ainda não seja possível comprovar através de dados, Marcus alerta para uma modificação na forma de realizar contribuições. Um exemplo atual é a relação da Loja de Departamentos Havan com as eleições de 2018 que elegeram Jair Bolsonaro. 

O apoio de Luciano Hang, proprietário da Havan, é explícito e causa debate desde 2018. Neste ano, o empresário foi condenado pelo Tribunal Superior Eleitoral (TSE) por pedir que seus funcionários votem em Bolsonaro nas eleições presidenciais. Em apoio ao político, Havan suspendeu propagandas na Rede Globo e vem aparecendo publicamente em diversos eventos ao lado do Presidente. 

Luciano já participou de lives em redes sociais ao lado do Presidente [Reprodução – Twitter]
Para Marcus, esse é o início de uma nova forma de financiamento e manutenção da campanha. “ Eles buscam formas indiretas. Não se pode financiar diretamente, mas ninguém proíbe a criação de eventos ou patrocínio de pessoas influentes que defendem a causa de um partido. A contribuição não deixou de existir.”

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