Pandemia permite vislumbrar a UTI do futuro

Ilustração da capa da dissertação: Marukopam/ Shutterstock.com

Com a pandemia, os olhos do público voltaram-se para hospitais e Unidades de Terapia Intensiva (UTIs). Um aspecto que pode passar despercebido está na maneira como esses ambientes são construídos e como ela influencia a saúde daqueles que os frequentam. Atentando-se a estas questões, a arquiteta Eleonora Coelho Zioni concluiu seu mestrado na Faculdade de Arquitetura e Urbanismo da USP (FAUUSP) com o objetivo de propor melhorias no ambiente hospitalar a partir de indicadores Influência no Bem-Estar Mental dos Usuários (IBEMU) nos projetos de arquitetura.

A pesquisadora relata que a arquitetura hospitalar é regulada por normas complexas, mas que essa promoção do bem-estar “é o mínimo a ser feito”. Para reduzir o estresse das pessoas e promover o bem-estar é necessário que o ambiente seja funcional, útil, atrativo, seguro e confortável. “Os arquitetos devem incluir, de maneira responsável, os aspectos que influenciam a saúde mental como um elemento na concepção arquitetônica durante o processo dos projetos.”

A UTI é uma área crítica, na qual os pacientes precisam de equipamentos, remédios e atenção constante dos profissionais de saúde. Essas unidades necessitam de uma infraestrutura de conforto específica: “iluminação natural, os revestimentos de piso, parede e teto devem ser higienizáveis para minimizar riscos de infecção; as instalações especiais devem possuir controle de temperatura e umidade do ar, a filtragem do ar deve ser fina; deve-se possuir gases medicinais como oxigênio, ar comprimido medicinal e vácuo clínico, os sistemas elétrico e de emergência devem ser diferenciados e incluir segurança contra incêndio”.

Em sua tese, Eleonora utilizou diversos métodos para entender como os usuários das UTIs avaliaram sua experiência nesses espaços, entre eles, ​benchmarking (análise de concorrentes do setor e como eles trabalham​)​, visitas presenciais ou virtuais, questionários, vistorias técnicas, entrevistas, nuvem de palavras e mapas de fluxos. O resultado das análises incluiu aspectos de infraestrutura, manutenção, acessibilidade, humanização e ambiência.

Segundo a pesquisadora, o aspecto que mais influenciou a percepção dos pacientes (44% das respostas) foi a ambiência. Ela envolve o conforto acústico para minimizar os muitos ruídos de uma UTI; conforto olfativo para minimizar odores desagradáveis e manter a qualidade do ar; conforto visual pelas cores dos revestimentos, mobiliário adequado, inserção de arte nos ambientes; equilíbrio entre iluminação natural e artificial e a sinalização de placas de ambientes e orientação adequada.

A tecnologia tem um papel nessa experiência dos usuários. De acordo com Zioni, o uso excessivo de tecnologias digitais e de comunicação rápida, inclusive pela equipe assistencial, pode causar mais ansiedade e enfraquecer relações. Entretanto, a pandemia teria acelerado mudanças “necessárias há muito tempo”, como a Telemedicina e a receita digital, mas “ressaltou os problemas que existiam de falta de leitos e má distribuição de recursos”.

Sobre os hospitais de campanha, Eleonora aponta que a “regra de ouro” é a separação de fluxos. “Separar o principal fluxo contaminado (covid-19) foi a melhor forma de não haver cruzamento e mais contágio”. Ela ainda imagina a UTI do futuro, com novas terapias e tecnologias de comunicação e o uso de robôs auxiliando na assistência, prevenção e tratamentos de doenças e da inteligência artificial para automação de dados. “Uma UTI no futuro precisa valorizar os desejos mentais e as percepções das pessoas já que são capazes de intervir no ambiente.”

Em decorrência da pandemia, Eleonora avalia que os hospitais foram merecidamente reconhecidos como um local de “herois”, pessoas que colocam suas vidas em risco para salvar a dos outros. E os movimentos de agradecimento nas redes sociais não ficaram restritos aos profissionais da saúde, mas também aos setores de apoio, como infraestrutura, arquitetura, engenharia, manutenção ou limpeza de hospitais.

Eleonora acredita que a arquitetura hospitalar e a necessidade de minimização dos riscos ambientais se tornaram evidentes nesse período. Ela espera que o período pós-pandemia traga​ ​a evolução do conceito de “Arquitetura para Saúde” e não só “Arquitetura Hospitalar”. “Eu sempre acreditei que hospitais precisam ser saudáveis e sustentáveis, assim como todos os ambientes construídos; a arquitetura para saúde tem o propósito de colaborar com o cuidar das pessoas, promovendo a saúde e não apenas evitando doenças.”

Para o século XXI, estão previstas mais emergências como a atual pandemia. Eleonora Zioni defende que é preciso que haja um planejamento integrado multidisciplinar entre arquitetos, profissionais de saúde, defesa civil e tecnologia da informação para criar edifícios de saúde resilientes que estejam preparados para futuros desafios. “A pandemia ensinou que o mais importante na vida é a saúde.”

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