Pesquisa da USP propõe alternativas para a conservação de patrimônio histórico

Estudo analisa métodos para a diminuição de riscos climáticos no Vale do Paraíba

Vale do Paraíba. Fonte: Travelpedia.com.br (Reprodução)

Por Vinícius Bernardes Mondin Guidio – vguidio@ig.com.br

Nos últimos meses a prefeitura do município de São Paulo instituiu no calendário da cidade a Jornada do Patrimônio, evento que tem como proposta a intensificação dos laços da população  para com seu patrimônio histórico-cultural.  Diferentemente dessa lógica, diversos outros municipios ainda se mostram renitentes na questão da conservação de seu patrimônio, de modo que muitas propriedades, que foram símbolos de épocas passadas, se encontram hoje em um elevado estágio de degradação. Tal situação é potencializada pelas drásticas alterações climáticas enfrentadas pelo planeta hoje, que somadas ao descaso público para com essas construções, agravam a precária conservação do patrimônio atual. Preocupada com essa questão, a pesquisa A vulnerabilidade de bens com função patrimonial às mudanças climáticas. Estudos para a formulação de políticas públicas de redução de riscos,  coordenada pela professora Silvia Zanirato — docente do IEE (Instituto de Energia e Meio Ambiente) e da EACH (Escola de Artes Ciência e Humanidades) — ambas da USP, tem estudado possíveis caminhos para a reversão desse quadro, com destaque para a situação em que a região do Vale Histórico Paulista se encontra inserida.

O estudo realizado tem como objetivo a comunicação, aos gestores públicos, dos problemas derivados da má conservação do patrimônio histórico. Com enfoque na região do Vale do Paraíba, o projeto centrou-se em analisar possíveis caminhos para a preservação das construções históricas do período cafeeiro — presentes nos seis municípios que compõem a região. Segundo a professora, tal pesquisa é um desdobramento de outra, realizada entre 2012 – 2014, que constatou a existência de áreas de risco no local, decorrente das atuais alterações climáticas. Com as vulnerabilidades identificadas, esse segundo estudo tem por meta articular possíveis soluções que revertam o problemático quadro encontrado no primeiro, evitando, desse modo, a ocorrência de possíveis tragédias.

Nesse sentido, a pesquisa tem estudado alternativas viáveis que diminuam os perigos em torno dessas construções, de modo que a sensibilização — da sociedade e dos órgão públicos — garanta a conservação do patrimônio, evitando a possibilidade de desmoronamento desses. A ausência de um investimento público nessa área — aliado a baixa preocupação social para com o valor histórico-cultural dessas propriedades — favorece, segundo Silvia, uma possível perda de tais construções em um cenário futuro, uma vez que as alterações climáticas tem acelerado a deterioração desse patrimônio. 

Silvia destaca ainda que a região do Vale Histórico Paulista é constantemente marcada por deslizamentos, em função da desproteção do solo — resultante de sua intensa exploração pela cultura do café. As construções do período, visando atender a demanda da produção cafeeira, se estruturaram próximas de cursos d’agua, a fim de garantir a lavagem dos grãos — necessária durante o seu processo de produção. De acordo com a professora, tal localização associada a declividade das Serras do Mar e da Mantiqueira ampliam a ocorrência de processos erosivos, principalmente em momentos de chuvas intensas. Dessa forma, os riscos de desmoronamentos, segundo ela, são ampliados, a medida que a infraestrutura frágil dificulta a sustentação plena de tais construções.       

O aumento da temperatura e a intensificação  do volume das precipitações são alguns dos efeitos decorrentes dessa alteração no clima. A principal consequência, conforme aponta a pesquisadora, é o estimulo à proliferação de insetos e microoganismos, intensificando o problema — visto que esses se alimentam dos materiais presentes nessas construções. Compostas de madeira, argila e fibras naturais, as casas do período cafeeiro se tornaram uma fonte de alimento para esses organismos, acelerando o processo de desgaste das estruturas que as sustentam. “ Um fator preocupante na região é a presença de cupins, que, com o aumento da temperatura, passam a se proliferar”, destaca Silvia. 

Os entraves para a solução

Ao identificar as vulnerabilidades da região, a pesquisa analisou as necessidades estruturais apresentadas por cada município do local, constatando os principais entraves para a conservação do patrimônio. A ausência de um investimento público nessa questão dificulta uma possível reversão do problema. Tal situação decorre muitas vezes, segundo a professora, da carência de verbas nessas regiões, a medida que os pequenos municípios frequentemente apresentam uma maior precariedade econômica. A carência de estruturas, como um sistema de drenagem hídrica eficiente, é apontado por ela como um dos entraves ao problema, uma vez que favorece o acúmulo de água e o consequente processo de erosão.   

Mais do que a identificação do problema, a docente destaca a necessidade de uma sensibilização pública em torno dessa questão, de modo que os possíveis riscos futuros sejam apresentados tanto ao governo quanto a sociedade. O principal objetivo é, segundo a professora, garantir a conservação do patrimônio e a segurança dos moradores locais, por meio da informação da população sobre os possíveis perigos. “Comunicar não é fácil, pois você incorre ao risco de criar cenários assustadores. A questão é como comunicar, de modo a sensibilizar os gestores públicos para que eles tomem as medidas necessárias para a reversão desse quadro”.

Seja o primeiro a comentar

Faça um comentário

Seu e-mail não será divulgado.


*