Há 7 anos, coletivo de extensão do IRI trabalha com a questão da imigração em São Paulo

Com a aprovação da nova lei de migração e mudança no tratamento ao estrangeiro, o grupo Educar para o Mundo pensa em mudanças na sua forma de trabalhar

Imagem: https://educarparaomundo.wordpress.com

Por Carolina Marins – carolinamarinsd@gmail.com

Os anos de 2015 e 2016 assistiram um boom de pessoas em migração, principalmente fugindo de situações de guerra e desastre naturais (em especial no caso do Haiti, que desde 2010 tenta se recuperar de um terremoto). O crescimento no número de pessoas em busca de refúgio escancarou o problema que o mundo tem para lidar com essas situações. Casos de xenofobia, exploração e legislações desumanas reviveram as discussões acerca da melhor forma de acolher essas pessoas.

O Brasil, embora tenha a fama de ser um país acolhedor, deixou bem claro que possui seu lado xenofóbico e discriminatório. Antes do surgimento dessa crise humanitária, as imigrações eram tratadas de forma secundária, ganhando destaque na mídia apenas em casos de crimes ou explorações análogas à escravidão envolvendo imigrantes (geralmente latinos). Entre 2011 e 2012 começou a crescer no Brasil a chegada de haitianos através da fronteira do Acre, situação esta que a mídia chamou de “invasão de haitianos”. Somente depois que os imigrantes começaram a chegar em estados do sul e do sudeste que a imprensa começou a pautar a crise que já vinha acontecendo há mais tempo.

Em um cenário que ainda não havia grupos de apoio a imigrantes, surgiu o projeto de extensão universitária, Educar para o Mundo (EPM), no Instituto de Relações Internacionais da USP, com coordenação da professora Deisy Ventura. Hoje o grupo não é mais um projeto de extensão, explica Gustavo Pereira Machado de Melo Souza, estudante do quarto ano do curso de Relações Internacionais e integrante do EPM, pois “um projeto tem começo, meio e fim, e nós não temos um fim”. Atualmente o EPM se denomina um coletivo de extensão universitária.

Gustavo explica que o coletivo surgiu em um contexto em que imigração era tratada apenas dentro do eixo EUA-México, sendo um tema completamente secundarizado no Brasil. “Quando o EPM surgiu, em 2009, a gente era muito significante, porque era um de pouquíssimos. Naquela época tinha a Cáritas, apesar de que ela não tinha a relevância que tem hoje; tinha o Cami, que é o Centro de Apoio e Pastoral do Migrante; tinha o Cdhic, que é o Centro de Direitos Humanos e Cidadania do Imigrante; entre outros. Mas, era algo muito apagado. A cidade de São Paulo, o estado e o Brasil colocam a imigração como parte do nosso sangue, mas o que acontece é que existe muita xenofobia. Então, naquela época que o EPM começou, ele era muito importante, tinha um impacto”.

Contudo, o estudante destaca que hoje o coletivo já tem um trabalho mais secundário, pois muitos órgãos e programas de apoio ao imigrante surgiram desde o início da crise de refugiados no mundo. A gestão do prefeito Fernando Haddad criou projetos e sancionou leis que garantisse uma melhora na vida dos imigrantes que chegassem a São Paulo. Por esse motivo, Gustavo vê essa mudança de relevância do grupo como algo positivo.

Em 2015, ele conta, os trabalhos foram um pouco menores. Desde quando pararam de trabalhar com a escola EMEF Infante Dom Henrique, onde trabalhavam com crianças brasileiras e estrangeiras sobre imigração e contra a xenofobia, o grupo começou a lidar com oficinas, com destaque para oficinas sobre trabalho e moradia que eram as maiores demandas, curso de português para refugiados, mesas de debate e atividades em outras instituições que trabalham com o tema. Contudo, vendo essa mudança de relevância, o coletivo decidiu mudar sua forma de trabalho. Em fevereiro haverá uma reunião para decidir os novos rumos do Educar para o Mundo. Para Gustavo, 2015 foi o fim de um ciclo para o EPM.

Nova Lei de Migração

No dia 6 de dezembro, a Câmara dos Deputados aprovou a nova lei de migração, uma vitória para os imigrantes que estão no Brasil, já que a única legislação a respeito era o Estatuto do Estrangeiro, criado na época da Ditadura Militar. O estatuto inferiorizava a condição de imigrante, restringindo-os de muitas coisas, dentre elas, participação política, comunicação por meios radiofônicos e até mesmo de possuir aeronaves. O documento antigo também torna a regularização de imigrantes ilegais muito mais burocrática.

A nova lei tornará o processo de regularização muito mais simples e acabará com essas restrições. Outra grande diferença é com relação a deportações. A Polícia Federal não poderá mais deportar migrantes detidos na fronteira, e estes terão acesso a defensores públicos. A medida causou resistência por parte da chamada “bancada da bala”.

Gustavo vê essa mudança na legislação de migração como algo positivo e aponta como um dos motivos para a mudança de foco do EPM. Frente a essas mudanças no tratamento aos estrangeiros, o grupo irá avaliar o que fazer no ano de 2017. O estudante levanta a possibilidade de voltarem a trabalhar com escolas.

A lei voltará para aprovação no Senado, onde há grandes expectativas de ser aprovada já que o autor do texto original é o senador Aloysio Nunes (PSDB). Em seguida a lei vai para sanção da Presidência.

USP e a Extensão Universitária

A extensão é um dos pilares da universidade brasileira. Resumidamente, é por meio dela que se leva todo o conhecimento produzido em ensino e pesquisa para a comunidade externa. Entretanto, Gustavo considera a extensão o pé mais deficiente desse tripé. A USP, em específico, é criticada por destinar muito menos dinheiro a essa parte da produção acadêmica do que para o ensino e a pesquisa, além de também incluir como extensão projetos que não são tão destinados a retorno de conhecimento a comunidade externa.

“Tudo que não é ensino e pesquisa vai para o balaio da extensão”, critica Gustavo, enquanto  utiliza o exemplo de alguns cursos de idiomas que são divulgados como projetos de extensão.

Fora dos muros da universidade muito pouco se conhece sobre extensão, e a população paulista raramente sabe que pode participar da vida universitária. “A ideia da extensão é que, primeiramente, criar conhecimento socialmente referenciado dentro da universidade, porque grande parte do conhecimento é produzido para empresas, então [dizem] ‘engenharia não tem como fazer algo social’, a galera do Escritório Piloto está lá para provar o contrário. Eles são um projeto de extensão, eles são agroecologia. Isso é a universidade pública a serviço do público, que é o que não acontece geralmente”.

Esse pouco incentivo aos grupos de extensão é o que acaba ofuscando os trabalhos de coletivos, como o Educar para o Mundo.

Seja o primeiro a comentar

Faça um comentário

Seu e-mail não será divulgado.


*