Agronegócio herói ou vilão

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O que você pensa sobre o Agronegócio? Não é incomum ouvir respostas muito negativas para essa pergunta. Contudo, como o setor que responde a aproximadamente 20% do PIB nacional, que é o responsável por manter os balanços comercias nacionais superavitários, e também por empregar (e continuar empregando mesmo em meio à crise econômica) 19 milhões de cidadãos, pode ter uma imagem tão ruim diante dos brasileiros? Essa é uma pergunta difícil. Porém, a comunicação eficiente e alguns esclarecimentos podem ajudar a respondê-la.

O mito do campo

O Brasil é um país agrícola muito bem-sucedido. Entre 2016 e 2017, segundo dados recentes da revista Agroanalysis, fomos responsáveis por 54,6% da produção mundial de suco de laranja; 35,9% da produção de café e mesmo em meio à crise econômica e política, o Brasil ainda se mantém como o segundo maior produtor de soja no mundo (em 2017, apenas atrás dos Estados Unidos).  Isso não significa, porém, que seja simples cultivar a terra. Em entrevista, para a AUN o ex-ministro da agricultura, pensador do agronegócio e professor doutor da Fundação Getúlio Vargas, Roberto Rodrigues, explica didaticamente. Tudo começou com a carta de Pero Vaz de Caminha a Dom Manuel, rei de Portugal, dizendo que na nova terra, tudo que se planta se colhe. “Eles chegaram no Sul da Bahia, naquela terra turfosa que é uma amostra muito pequena das terras do Brasil. Temos um país gigante com só 7% de terras naturalmente férteis”. É o mito da fertilidade que muitos de nós, urbanos, temos contato muito cedo, nos primeiros anos da escola.

Laranja, produzimos, segundo dados da Agroanalysis, 31,4% da produção mundial. Disponível em:http://www.stickpng.com/img/food/fruits/oranges/two-slices-and-three- oranges Café, outro produto chave de produção no Brasil. Disponível em:http://www.pngmart.com/image/4604

 

Avancemos alguns séculos e, em 1900, o escritor Monteiro Lobato cria seu famoso personagem rural, o preguiçoso Jeca Tatu. No imaginário popular, agricultura torna-se uma atividade medíocre, realizável com facilidade até mesmo para o mais preguiçoso dos homens, já que a terra é fértil. Ledo engano. Na realidade, o Brasil, apesar das proporções continentais, não possui tantas terras agricultáveis. O bioma cerrado, do Centro-Oeste, por exemplo, só é utilizável quando tratado da maneira correta. Ou seja, o Brasil só é um país da agricultura porque seus agricultores têm capacidade, formação e tecnologia para produzir. “A figura do Jeca Tatu foi real, mas há cem anos, hoje o produtor brasileiro é o mais competente do mundo”, completa o professor.

 

O agricultor

Chegamos a outra questão, o agricultor, figura central do agronegócio. Como ele é visto pela sociedade? Na Europa, uma pesquisa feita pela Universidade de Évora pedia aos cidadãos que assinalassem a alternativa que melhor caracterizasse o homem do campo. A maioria respondeu: “um herói”. E no Brasil, qual seria esse resultado?

A Europa viveu duas guerras terríveis no século 20. A fome, a mais cruel das privações, assolou o continente. Assim, quando o europeu vê o agricultor, ele o vê como responsável por não deixar tamanho sofrimento se repetir, pois o campo alimenta as pessoas e por já terem vivido a fome, eles o reconhecem como “herói”. No Brasil, a história foi diferente. Somos o país que há mais tempo não declara guerra. Aqui não se experimentou a dor da falta de alimentos e, sobretudo, não se perceba o quanto a cidade depende do campo.

Olhe para suas roupas, sem a agricultura produzindo algodão, você não as teria; o papel que segura só foi possível com a produção de celulose, que também é agricultura; os alimentos que consumiu durante o dia; até os perfumes e colônias que passou vieram de flores que foram cultivadas. A cidade precisa do campo para se sustentar, e vice-versa. Esse valor, da terra e dos seus produtos, está esquecido, e precisa ser urgentemente lembrado.

A tecnologia

Uma das grandes questões do agronegócio no século 21 é como tornar a prática mais ecologicamente correta.. Disponível em: 3https://conteudo.imguol.com.br/c/entretenimento/06/2016/09/21/arvores-
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E quanto à poluição, destruição ambiental, uso de alimentos transgênicos, defensivos químicos? As questões ambientais são uma preocupação mundial, e isso inclui o agronegócio. Pesquisas são feitas a todo momento para tornar o cultivo mais sustentável, de todas as formas possíveis. Graças a esses esforços, nos últimos dez anos, a produção agrícola brasileira aumentou em dez vezes, sendo que a área cultivada aumentou em uma vez. Plantar de forma mais ecológica, aumentando a produtividade sempre visando melhorar a qualidade e os preços dos alimentos que chegam nas mesas das casas ou são exportados, é uma meta permanente para lugares como o Instituto Agronômico de Campinas, o IAC e a Bayer, para dar exemplos do estado de São Paulo.

O que acontece é que a tecnologia ambiental é relativamente recente e ruídos de comunicação levaram a uma sucessão de conceitos equivocados. Por exemplo, você sabia que variedades “gourmet” de arroz são alimentos geneticamente modificados? E que essas e muitas outras variedades de cultivos são desenvolvidas para que produtores de regiões com climas diferentes também possam plantar e tirar seu sustento? Alimentos diferenciados, flores ornamentais (a cooperativa de flores ornamentais Veiling de Holambra, no interior paulista, é um ótimo modelo disso), são formas de garantir ao pequeno produtor maior renda, baseada na qualificação e sofisticação de seu trabalho. O IAC, em Campinas, desenvolveu em laboratório, espécies de café para climas mais frios, feijão mais nutritivo (com mais Ferro) para que a saúde da população melhorasse. Todos esses são organismos geneticamente modificados, OGMs, e não há nada de maligno neles.

Arroz preto, uma variedade considerada gourmet, típica da Ásia, modificada pelo IAC para poder ser cultivado no
sudeste brasileiro. Disponível em: http://d26lpennugtm8s.cloudfront.net/stores/328/703/products/black-rice-close-
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Feijão carioca, outra variedade de cultivar aprimorada pelo IAC. Disponível em: https://serbiotrendies.com/wp-
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Os temíveis transgênicos, introduzidos nos anos 1980, seguem a mesma lógica do arroz gourmet: tentar aumentar a produtividade por meio de inserção de características vantajosas. Só que a maneira como foram apresentados ao público na época não deixou claro quais eram os motivos e os benefícios de sua criação. Plantas mais resistentes a pragas melhoram a produção e permitem seu cultivo nas mais diversas áreas. Isso seria uma possibilidade muito real de baratear os alimentos e reduzir a fome no mundo. Segundo dados das Nações Unidas, dos anos 1990 até hoje, 200 milhões de pessoas deixaram de passar fome. E hoje, estudos da Academia Nacional de Ciências dos Estados Unidos descartam as controvérsias e especulações de que os transgênicos comprometeriam a saúde. A falha dos transgênicos não foi técnica, foi comunicacional. Porque tentaram “impor” os transgênicos, ao invés de explicá-los, criou-se no imaginário popular um verdadeiro “fantasma”. É hora, no entanto, de compreender os mal-entendidos.

Colocando na balança

Com os estigmas do Agronegócio deixados para trás, poderemos olhar para essa atividade econômica de forma mais acurada e também mais crítica. “Tudo é agricultura! Só que nós esquecemos disso”, coloca o professor Rodrigues. Não se trata de ignorar os desafios constantes que o agronegócio tem de enfrentar: oferecer produtos mais sustentáveis, de melhor qualidade, para cada vez mais pessoas. Trata-se de reconhecer o campo na vida e no cotidiano de todos e, sobretudo, de olhar o agricultor como um brasileiro, herói como todos os brasileiros, tentando fazer da terra o seu e o nosso sustento.

Links relevantes

Pesquisa da Universidade de Évora. http://dspace.uevora.pt/rdpc/request-item;jsessionid=32B98F01CB871DCDF67827A2AD7BA96C?handle=10174/20166&bitstream-id=58057.

Estatísiticas do Agronegócio. http://www.cepea.esalq.usp.br/br/pib-do-agronegocio-brasileiro.aspx

http://g1.globo.com/economia/agronegocios/agro-a-industria-riqueza-do-brasil/noticia/2016/12/agronegocio-brasileiro-emprega-19-milhoes-de-pessoas.html

https://nacoesunidas.org/relatorio-da-onu-fome-diminui-mas-ainda-ha-805-milhoes-de-pessoas-no-mundo-com-desnutricao-cronica/

Pesquisa da Academia Nacional de Ciências. http://zh.clicrbs.com.br/rs/vida-e-estilo/vida/noticia/2016/05/transgenicos-nao-causam-danos-a-saude-dizem-cientistas-norte-americanos-5804112.html

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