Pesquisadora da USP defende primeira tese sobre feminismo islâmico

Crédito: Pinterest

Por meio de um trabalho pioneiro para sua tese de doutorado, a pesquisadora Cila Lima, do Instituto de Relações Internacionais, realizou uma pesquisa sobre o feminismo islâmico com o objetivo de mostrar as contribuições desse movimento para a vida da mulher muçulmana.

Além de ser desconhecido do movimento feminista internacional, que, muitas vezes, apenas enxergam as mulheres muçulmanas como fracas e submissas, afirma Cila, o feminismo islâmico também é visto como algo recente. “O senso comum acredita que o feminismo surgiu com Malala [paquistanesa ganhadora do prêmio Nobel em 2014] no Oriente Médio, sendo que existe desde dos anos 20”.

A pesquisadora afirma que outra confusão é considerar o feminismo islâmico como um movimento único, enquanto há, no mínimo, três vertentes. De um lado, o movimento feminista secular (internacionalista, defensor dos direito das mulheres), o movimento islamista (ativismo-religioso fundamentalista) e o feminismo islâmico (desterritorializado e transnacional).

Essas vertentes feministas pós-coloniais desenvolveram-se do choque entre os feminismo seculares organizados (presente nos países muçulmanos desde dos anos 20) e o processo de reislamização ou reavivação que vem ocorrendo no mundo. Esse segmento produziu muitas respostas fundamentalistas para problemas internos no Islã, como as mulheres islamistas.

A pesquisadora alerta para a importância de diferenciar os termos islâmico e islamista. “Quando se refere a um grupo islâmico, não está necessariamente se referindo a um grupo islamista, mas quando se refere a um grupo islamista, necessariamente está se referindo a um grupo islâmico”, afirma. Isso porque Islamismo (adjetivo islamista) não pode ser confundido com Islã, já que islamismo refere-se a um pequeno grupo dentro do Islã, de viés fundamentalista que faz leitura fundamentalista das fontes religiosas, e luta pela volta da Sharia (sistema de leis) e ao sistema de califados. Enquanto Islã (adjetivo islâmico) é todo o conjunto de ideias religiosas provenientes do profeta Muhammad.

O foco da pesquisadora é principalmente o feminismo islâmico que surge nos anos 80, dentro desses enfrentamentos do paradigma islâmico.  Por meio de tasfir (comentários do Alcorão) e ijihad (análise racional das fontes religiosas), esse movimento tem como propósito uma reforma no Islã, de forma a eliminar interpretações patriarcais, promovendo cortes na sharia, por exemplo contra as penas de morte por apedrejamento impostas às mulheres pelo Estado sob a alegação de zina (sexo antes do casamento ou adultério). Uma leitura feminista das fontes religiosas permite alavancar possíveis direitos emancipatórios para melhorar o status socioeconômico das mulheres muçulmanas.

Por meio de uma busca em sites e páginas de Facebook, Cila fez um levantamento da presença dos movimentos feministas em países muçulmanos, o que proporcionou a elaboração de quadros demonstrativos da vasta produção teórica sobre mulheres ou movimento de mulheres muçulmanas. Foram mais de 100 listados, sendo que a pesquisa é limitada e restringiu-se apenas ao conteúdo em árabe, inglês e francês. Fica evidente, uma grande presença do feminismo islâmico em organizações formais em países muçulmanos como Turquia, Egito, Tunísia, Jordânia, Argélia, Irã, Indonésia, Malásia, Bangladesh, Marrocos, Camarões, entre outros

Assim, foi possível, segundo a pesquisadora, caracterizar  os feminismos dentro de suas particularidades e diferenciá-los de outros movimentos. Cila ainda afirma que sua tese de doutorado tem como cerne – “compreender a narrativa desse movimento social feminista, as suas características particulares e o seu interesse político dentro das disputas pelas consciências”.

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