Sucesso do reflorestamento depende do nível de degradação do solo

Tese de doutorado investiga os elementos que influenciaram os processos do Programa Mata Ciliar, realizado em múltiplas áreas do estado de São Paulo

Os resultados diversos de programas de reflorestamento estão diretamente relacionados ao microclima de uma região e às condições iniciais do solo. Esta é a conclusão da tese de doutorado de Renato Toledo, “Restauração de florestas tropicais em paisagens rurais: a influência do solo e cobertura florestal adjacente”. Usando como base sua experiência no amplo programa de recuperação de matas ciliares realizado pela Coordenadoria de Biodiversidade e Recursos Naturais (CBRN), seção da Secretaria do Meio Ambiente, sua pesquisa teve o objetivo de diagnosticar os fatores que influenciaram no sucesso do programa em determinadas áreas e aqueles que o impediram em outras.

No projeto realizado há 11 anos, foram promovidos cerca de 500 restauros em áreas de oeste a leste do estado de São Paulo, fazendo uso de uma rede de cooperação composta por agricultores, ecólogos e ONGs. Apesar de contar com casos de sucesso e ter tido uma repercussão mundial na época em que foi anunciado, o programa de restauração desapareceu aos poucos, na medida em que os envolvidos começaram a se frustrar com os resultados.

Ele comenta que a diversidade de áreas torna as falhas do programa algo mais complexo. “Nós sabíamos que esses restauros haviam entrado em algumas paisagens muito degradadas e em outras que estavam em situações de menor desgaste”, explica Renato. “Queríamos ver qual era a influência da degradação na recuperação dessa paisagem. Será que eles não foram restaurar em áreas já muito prejudicadas, onde um ganho pequeno já deveria ser considerado uma grande vitória?”, pondera. Segundo o pesquisador, a desconsideração da influência da condição do solo e dos níveis de desmatamento levou a uma culpabilização injusta dos agricultores, que receberam as mesmas instruções para cuidar de áreas que precisavam de estratégias personalizadas.

No primeiro capítulo da tese, Renato dedicou-se a realizar uma análise de planejamento regional, delineando os diferentes perfis de áreas verdes a serem restauradas e comparando a situação da cobertura florestal de São Paulo às condições de recuperação estipuladas a nível mundial. Sua pesquisa revelou que o estado não é nem um pouco ideal para um projeto do tipo. “A cobertura florestal que sobrou está muito aquém do mínimo necessário para que a recuperação fosse favorável. Está ao menos duas vezes abaixo.” conta. “Na maior parte do estado, temos uma cobertura florestal tão baixa que, realmente, não devia se esperar que a recuperação fosse tranquila.”

Renato também ressalta a complexidade do processo de reflorestamento. “Quando falamos desse assunto, pensamos apenas em trazer as árvores de volta. Mas elas são só uma parte da floresta: existe uma fauna associada ao solo e um ambiente físico-químico ideal, que frequentemente foram totalmente perturbados nas áreas em que se resolve trabalhar”.

Áreas muito degradadas se tornam mais custosas para reflorestar, uma vez que tratamentos prévios são necessários para garantir o mínimo de sucesso. “É algo que varia de caso a caso. Ações de bioengenharia para conter erosão; adubação verde ou a remoção de uma camada de areia se a área foi assoreada”, exemplifica Renato. Tais processos, além de custosos, também são mais demorados, deixando a nova vegetação extremamente vulnerável ao clima e a possíveis espécies invasoras. Esse estágio de fragilidade pode perdurar por décadas dependendo do nível de degradação da área.

Sua análise, no entanto, também aponta para uma saída: o microplanejamento das ações. “ “Se for possível detalhar o planejamento, ao invés de fazer um projeto que pretende atingir todas as regiões e casos, buscando áreas onde a recuperação é factível, é possível reduzir bastante os custos”, diz.

Influência da vegetação ao redor

No segundo capítulo da tese, encontram-se os dados de biomassa de 32 restauros do programa, todos situados ao leste do estado. Em cada uma delas, Renato e Rozely mediram as árvores, fizeram análises de paisagem por satélite para avaliar a cobertura florestal e coletaram amostras do solo. Nesse processo, a dupla foi capaz de identificar mais de 130 espécies, a maioria proveniente de regeneração natural, e não das mudas que haviam sido plantadas.

“Foi interessante notar que, apesar de terem sido plantadas de formas semelhantes, as florestas seguiram trajetórias diferentes. Encontramos desde áreas que eram florestas de grande porte, mesmo em um estágio inicial, até áreas que eram pastos sujos, de baixíssima biomassa, como campos abandonados.”, relata Renato. A partir disso, foi feito um modelo que apontou que a quantidade de biomassa de uma área reflorestada é proporcional à cobertura florestal presente em um raio de 200 metros. Também foi descoberto que, para garantir o sucesso do reflorestamento, não basta um solo fértil: ele deve ser pouco arenoso. Solos arenosos, além de favorecerem a estiagem, não são capazes de manter espécies especialistas — ou seja, aquelas que definem um ambiente de Mata Atlântica e, consequentemente, dependem determinadas configurações químicas e climáticas.

Por meio desse estudo, eles também refutaram uma de suas suposições iniciais: as áreas mais próximas a florestas não registraram maior presença de espécies especialistas. A quantidade de floresta ao redor das áreas de reflorestamento ajuda apenas na propagação de espécies que são dispersas pelo vento, enquanto aquelas que dependem de animais para se espalhar são menos presentes e mais imprevisíveis — no entanto, cerca de 80% das espécies nativas de florestas tropicais são zooicas, ou seja, encaixam-se no segundo grupo.

Assim, constatou-se que a proximidade a florestas mais jovens garante o estabelecimento de uma cobertura florestal com maior rapidez. “Os fragmentos jovens contribuem muito numericamente, mas são pobres qualitativamente, porque não possuem sementes grandes especialistas em florestas.”, diz Renato. Isso garantiria florestas menos frágeis, porém pouco complexas, ilustrando o desafio final do reflorestamento: gerar uma vegetação que possa, de fato, substituir aquela que foi desmatada.

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