Busca por sinais de vida se expande para além de Zonas Habitáveis

Concepção artística de uma exolua semelhante à Terra orbitando um planeta gigante similar a Saturno (Imagem: Dan Durda).

A procura por evidências de vida fora do planeta Terra é uma questão há muito tempo presente nas discussões da humanidade. Frequentemente são desenvolvidos novos estudos e métodos de observação que visam entender melhor a complexidade do Universo. Atualmente, várias pesquisas procuram desenvolver metodologias com o objetivo de encontrar possíveis pistas que comprovem a existência de seres vivos em outros planetas. A dissertação de mestrado de Luander Bernardes, desenvolvida junto ao programa de pós-graduação em Astronomia do Instituto de Astronomia, Geofísica e Ciências Atmosféricas (IAG-USP), sob a orientação do professor Eduardo Janot Pacheco, investigou temas relacionados a essa busca.

A pesquisa de Bernardes é centrada na Astrobiologia, uma ciência interdisciplinar dedicada a estudar a origem e evolução da vida no Universo. Nesse contexto, valeu-se do estudo de seres extremófilos para definir novos parâmetros de habitabilidade planetária.

Extremófilos são micro-organismos terrestres capazes de sobreviver sob condições extremas de temperatura, pressão, umidade, nível de radiação, salinidade e pH, algo que seria difícil ou até mesmo impossível para os seres humanos.

De forma geral, a pesquisa ampliou o conceito de habitabilidade planetária ao considerar a possibilidade de sobrevivência de micro-organismos extremófilos na superfície de exoplanetas, planetas que orbitam outras estrelas, e exoluas, satélite naturais que orbitam planetas extrasolares.

Representação da expansão do conceito da habitabilidade. (Imagem: Luander Bernardes)

O pesquisador explica que quando se analisa um conjunto de condições que fazem de um planeta um ambiente habitável, como a presença de água líquida e de um envoltório gasoso, estabilidade orbital e condições geodinâmicas, “nota-se que as condições mesófilas, temperaturas no intervalo de 15°C e 50°C, ocorrem em um ponto específico da interseção entre esses fatores, enquanto a extremófila abrange um leque maior de possibilidades, o que nos leva a crer que microrganismos extremófilos estejam espalhados pela galáxia.”

Luander afirma que microrganismos como os tardígrados são candidatos naturais a habitarem meios extraterrestres onde esses ambientes podem ser encontrados. Essas condições podem ser observadas até mesmo em alguns meios do próprio Sistema Solar, como as baixas temperaturas, umidade e pressão de Marte, a composição superficial de amônia, água e hidrocarbonetos de Titã, satélite natural de Saturno, e a existência de um vasto oceano com temperatura amena sob a superfície de Europa, satélite natural de Júpiter.

Ilustração das definições das Zonas Habitável, representada pela região verde, e Extremófila, região compreendida entre as linhas vermelhas. (Imagem: Luander Bernardes)

Ambientes simulados

Em uma primeira etapa da pesquisa, os estudos tinham como objetivo simular a posição de exoplanetas semelhantes a Terra – com seus possíveis satélites naturais – dentro Zona Habitável (ZH), definida por uma coroa circular em torno da estrela central de um sistema planetário. Esses são locais onde as condições físicas permitem a existência de água no estado líquido, o que leva a acreditar que planetas e satélites localizados nessas regiões podem ser habitáveis, levando em conta as circunstâncias sob as quais surgiu vida na Terra.

Luander explica que foi necessário ampliar o conceito de ZH para algo mais amplo, conhecido como Zona Extremófila, devido a ciência da existência de vida extremófila. Segundo ele “a posição e extensão da ZH ou ZE depende da temperatura na superfície do planeta ou satélite natural, ou seja, depende dentre outros fatores, do raio da órbita planetária e do tipo espectral da estrela. Sua posição varia também no tempo, na medida em que a estrela evolui.”

Para definir a ZE e estimar a possibilidade de sobrevivência de micro-organismos extremófilos na superfície de exoplanetas foram utilizados métodos baseados em leis físicas já conhecidas. “Utilizamos um modelo que simula a atmosfera terrestre primordial, composta principalmente por nitrogênio, água e dióxido de carbono. A partir dele foi possível estimar a temperatura média e a pressão parcial de CO2 na superfície de exoplanetas até então conhecidos”, explica o pesquisador.

Esquema simplificado do modelo utilizado na simulação das condições de habitabilidade. (Imagem: Luander Bernardes)

Exoplanetas, exoluas e a vida

Além das simulações relacionadas aos exoplanetas, foram realizadas também estudos acerca da possibilidade de exoluas com massa suficiente para reter atmosfera e manter atividades geológicas por bilhões de anos, orbitarem exoplanetas gigantes localizados dentro das Zonas Habitável ou Extremófila. “Com essa finalidade, acoplamos ao modelo que simula a atmosfera planetária, um modelo que simula o decaimento orbital ao longo do tempo. Esse procedimento foi feito para que pudéssemos determinar a região orbital estável onde uma exolua deveria se encontrar para que não sofresse perturbações estelar ou de seu planeta hospedeiro”, complementa.

O modelo indica que planetas similares à Terra, mas localizados em distâncias orbitais mais afastadas da Zona Habitável, possivelmente manteriam água líquida em sua superfície, mas as altas concentrações de dióxido de carbono em sua atmosfera, permitiriam a sobrevivência apenas de organismos menos complexos. Dessa forma, segundo Bernardes, o modelo de observação utilizado serviu como uma espécie de “filtro”, na busca de posições orbitais em que exoplanetas podem ser habitáveis.

Luander lembra que, ao analisar a possível existência de microrganismos extremófilos em exoluas, seria importante considerar a possibilidade desses satélites adquirirem energia de fontes diferentes da solar, como por meio de forças de maré. “Dessa forma, exoluas que orbitam planetas gigantes além da Zona Extremófila, similares às observadas no Sistema Solar, poderiam garantir a presença de extremófilos em suas superfícies”, afirma. “Esse complexo sistema planeta-lua ainda pode receber material biológico via corpos externos como meteoritos, poeira interestelar, cometas, ou até mesmo através da transferência direta de uma exolua a outra.”

O pesquisador acredita que investigar modelos que simulam a composição físico-química de planetas habitáveis é fundamental para a Astrobiologia, por serem um caminho pelo qual será possível decidir quais deles são mais suscetíveis a abrigar vida. “Com isso, decidiremos de maneira coerente quais são os melhores alvos para estudos mais detalhados de suas características.”

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