Metrô paulista evidencia desigualdade social

Pesquisa analisou o discurso do metrô como indutor de desenvolvimento urbano e a sua prática

Operários trabalham na entrada da estação Moema. Foto: Renato SCerqueiraFutura Press

“Por que o metrô fala uma coisa e faz outra?”. Essa é a pergunta que Geraldo Calmon de Moura tenta responder em seu doutorado “Diferenças entre a retórica e a prática na implantação do Metrô de São Paulo”, produzida na Faculdade de Arquitetura e Urbanismo (FAU) da USP. Segundo o autor, o metrô de São Paulo é um símbolo do desenvolvimento chegando às regiões mais afastadas. Os próprios estadistas usam esse discurso em suas campanhas eleitorais, mas não é bem essa a lógica que a construção da cidade tem seguido as linhas metroviárias, sendo até revertida muitas vezes.

A construção de uma linha de metrô começa com uma pesquisa de origem-destino. Entretanto, a capital paulista foi construída seguindo um método radiocentrico, na qual o centro abriga as atividades econômicas e aqueles que têm condições financeiras de se estabelecerem em locais centrais, seguindo uma lógica de mercado.”Quando se implanta o metrô, você induz uma ocupação do solo ao redor. Se deixar só o mercado agir, vai ser uma ocupação excludente”, explica o pesquisador. Um exemplo é a Linha Vermelha, no sentido da zona leste.

Metrô SP Shoppings-FolhaSP

Ele explica que a região é distante das oportunidades, mas possui estações. Dessa forma, mais pessoas se mudam para seus entornos por justamente existir uma linha de metrô que as aproximam dos centros urbanos. Entretanto, com a valorização dessas regiões mais distantes, o mercado imobiliário, ao se apossar desse movimento, cria grandes empreendimentos de moradia. Isso acaba afastando cada vez mais as pessoas com menos renda, gerando o processo de gentrificação desses bairros. Ou seja, pessoas que já possuem boas oportunidades se mudam para bairros mais afastados, devido à valorização trazida pelo metrô, e repelem aqueles que mais precisam. Outros estudos, também realizados na FAU, apontam que 70% das pessoas que recebem mais de 20 salários mínimos residem a menos de um quilômetro de uma estação de metrô.

Segundo Geraldo, “o que deveria ser feito é justamente o contrário: levar cidade aonde moram pessoas e pessoas onde há cidades”. Isso significa que o ideal seria levar oportunidades de emprego e ensino para os locais afastado, usando o metrô como um impulsor desse movimento. Ele ainda defende que é possível fazer isso de forma que seja rentável para o setor privado e benéfico para a cidade como um todo. O Plano Diretor de 2014 foi uma tentativa que mostrou que era possível usar o metrô como indutor de desenvolvimento de qualidade.

Plano Diretor é um instrumento público de controle urbano. Ele delimita e estabelece regras fixas para ordenar a ocupação e uso do solo urbano. Geraldo Calmon explica que, em parceria com o capital privado, pode-se fazer com que a cidade não seja construída só para o mercado imobiliário.

A realidade é complexa

Apesar da presença marcante de estações de metrô em bairros nobres da capital paulista, os moradores da região de Moema criaram grandes entraves à construção de estações da Linha 5 – Lilás, que passará pela região. Quando perguntado sobre esse paradoxo, o pesquisador responde: “a realidade é complexa”.

Para ele, esse fenômeno é o reflexo da segregação socioespacial que existe na sociedade brasileira. “Existe uma dualidade desses moradores”, afirma, pois ao mesmo tempo em que têm medo de que um instrumento do estado possa levar “tipos de pessoas estranhas ao local”, esses moradores querem o metrô para trazer mão de obra barata e desqualificada para perto. Cria-se, assim, uma cidade pendular, na qual não há misturas de classes e pessoas, tornando São Paulo em uma metrópole “anti-urbana”. O metrô paulista e a forma como é construído são evidências de uma cidade segregada.

Seja o primeiro a comentar

Faça um comentário

Seu e-mail não será divulgado.


*