Produto químico beneficiará conservação dos monumentos históricos

Feito à base de sílica e titânia, item reduziria custos e necessidade de manutenção das obras

Fachada do Theatro Municipal foi originalmente feita em arenito Itararé, uma rocha pouco resistente. (Reprodução/Wikimedia Commons)

As esculturas e construções revestidas por rochas podem, ao longo do tempo, apresentar problemas diversos. O geólogo é o profissional capacitado para diagnosticar estes problemas e buscar as melhores soluções para cada tipo de rocha ou minerais encontrados. Quando se tem uma escultura e se perde a sua superfície, por exemplo, perde-se a obra de arte, pois a escultura não é a rocha em si, mas sim a superfície entalhada.

Conservação de patrimônio construído é uma das linhas de pesquisa do grupo GeoHereditas, do Instituto de Geociências da Universidade de São Paulo. Nele, a pós-doutoranda Danielle Grossi desenvolve estudos voltados à conservação de monumentos históricos da cidade de São Paulo.

O objetivo da pesquisa é desenvolver um produto de baixo custo e que a composição seja melhor controlada, pois os produtos vendidos no mercado têm uma composição fixa, não podendo ser adaptados para o tipo de rocha. A partir da síntese de dois agentes, a sílica e a titânia, a pesquisadora pretende criar um produto com propriedades autolimpantes e hidrofugantes.

Grossi notou a necessidade de fazer o produto por conta dos poluentes atmosféricos, principalmente de combustível fóssil, que entram em contato com os minerais e degradam a rocha. A necessidade veio para prolongar a vida do monumento.

No pós-doutorado, o objeto de estudo da pesquisadora são o granito Itaquera e o arenito Itararé. “O granito Itaquera foi largamente utilizado em São Paulo, como no monumento Ramos de Azevedo, no embasamento do Theatro Municipal, algumas esculturas no Parque da Luz e em outros edifícios históricos. O arenito Itararé é uma rocha que está na fachada do Theatro Municipal. Apesar de bonito, por ser uma rocha sedimentar composta por argilas expansivas, ele se degrada muito facilmente”, explica.

A pesquisa começou a ser desenvolvida em 2018, surgindo a partir do trabalho desenvolvido no doutorado, onde a pesquisadora viu a necessidade de um estudo mais aprofundado a fim de criar um produto para esses tipos específicos de rocha. No doutorado, ela estudou um produto consolidante, e, no pós-doutorado, está produzindo a titânia em laboratório para a função autolimpante.

Grossi pesquisa uma composição que possibilite, ao mesmo tempo, que a água em sua forma líquida não penetre na rocha e que poluentes atmosféricos não se depositem e escureçam o embasamento rochoso. Essas duas propriedades são essenciais para conservar a rocha e prolongar o tempo entre a necessidade de manutenção.

Danielle vem produzindo a titânia (TiO2) em laboratório. “No Japão descobriram que ela tem uma propriedade de autolimpante. Isso significa que, com o sol, a titânia reage de uma forma que vai degradando esses poluentes que se depositam na superfície da rocha, transformando-os numa substância não danosa. A intenção deste produto não é de remover a sujeira, e sim evitar que esses poluentes se depositem na superfície rochosa”.

A pesquisadora explica que, aplicando este produto à base de titânia após a manutenção, o tempo necessário para uma próxima limpeza é prolongado, evita também mais gastos com a conservação do monumento, pois se trata de um processo caro.

O diagnóstico da degradação não é igual para as duas rochas estudadas. No caso do arenito Itararé, que é uma rocha sedimentar, o contato da argila expansiva com a água provoca a expansão dos minerais. Depois de secos, estes levam à contração da argila, criando um espaço entre os minerais que compõem a rocha. Esse movimento de expansão e contração deixa a rocha friável e faz com que ela se desmanche.

Monumento a Ramos de Azevedo, próximo a Escola Politécnica da USP, foi construído em granito Itaquera e bronze. USP Imagens

O granito Itaquera é uma rocha magmática, bem mais resistente, e a intenção é evitar a manutenção. “O que acontece lá no centro (com o granito Itaquera) é que as pessoas urinam nos monumentos. A urina tem sais que, quando secam, expandem e degradam a rocha. Aqui na USP não encontramos este problema porque não há este tipo de ação antrópica no monumento, mas no centro pode-se notar que o embasamento está estufado, se degradando”.

No caso do granito, a intenção é uma ação preventiva. O propósito é deixar a rocha com o aspecto limpo, sem manchas e escurecimento: “é evitar uma manutenção, porque a prefeitura muitas vezes usa desinfetante, como a creolina, substâncias fortes que acabam estragando o monumento”, lamenta.

Para a pesquisadora, o desafio atual é produzir um grão de titânia ainda menor, pois a titânia age melhor quando seus grãos estão nanométricos, ou seja, bem pequenos. O objetivo da pesquisa de pós-doutorado é juntar, em um único produto, os benefícios da sílica e da titânia para a conservação dos monumentos históricos.

Até o momento, o resultado foi de uma boa hidrofugação, mas Danielle deseja aumentar essa proteção à água sem prejudicar a capilaridade da rocha. “Alterar a capilaridade poderia resultar em a rocha ‘buscar’ água de outros lugares.  Na nova etapa queremos ver se o produto conseguirá ser mais repelente à água, manter a fotocatálise e não mudar a dinâmica de transporte de água da rocha, ou seja, sua capilaridade. São muitas variáveis que precisamos levar em conta”, explica.

Até este momento da pesquisa, iniciada neste ano, o produto precisa ser aperfeiçoado, pois apresentou uma performance melhor em apenas uma das rochas estudadas, necessitando de novos testes. Na nova fase, será testada uma nova forma de produzir a titânia e aumentar a hidrofugacidade do produto. “O óxido de titânia (TiO2), um pó branco produzido em laboratório. Existem titânias comerciais que já vendem prontos, mas não com o componente principal que precisamos. Nossa intenção é produzir focando em um dos minerais da titânia para o uso específico nas rochas estudadas”.

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