Falta de comunicação prejudica acompanhamento de câncer bucal

Dentistas da atenção básica não recebem retorno de pacientes encaminhados para centros de especialidades, equipe de saúde da família pode ser solução para a rede pública

CEOs atendem cinco especialidades: estomatologia, pacientes com necessidades especiais, cirurgia, endodontia e periodontia especializada (Imagem: Prefeitura de Campo Alegre)

A falta de diálogo entre a atenção básica e os centros de especialidades odontológicas da rede pública de saúde causa problemas no acompanhamento de pacientes com câncer de boca. É o que diz um estudo qualitativo realizado pela Faculdade de Odontologia da USP. A pesquisa, realizada com 17 profissionais da área, mostrou que a rede de tratamento odontológico, apesar de bem estruturada, falha na troca de informação entre os seus níveis.

Segundo Mariana Lopes, pesquisadora responsável pelo estudo, a criação do SUS tornou a atenção básica responsável, também, pelos cuidados odontológicos. “A porta de entrada do paciente no sistema é a UBS. Ele chega na UBS e, se identificada a suspeita do câncer de boca, é encaminhado para a [atenção] secundária – o centro de especialidade odontológica – onde ocorre a biópsia e o diagnóstico”. A partir daí, se confirmado o diagnóstico, o paciente segue para a atenção terciária, onde realizará o tratamento mais indicado para o seu caso, geralmente com uma equipe multidisciplinar de dentistas e médicos oncologistas.

Os centros de especialidades odontológicas, ou CEOs, são uma iniciativa da Política Nacional de Saúde Bucal – Programa Brasil Sorridente, e existem há 16 anos, desde 2003. O objetivo é ampliar a cobertura odontológica realizada pelo SUS por meio de clínicas especializadas capacitadas para a realização de procedimentos mais complexos como cirurgias, biópsias, tratamento de canal, entre outros. Um CEO oferece no mínimo cinco especialidades: estomatologia, pacientes com necessidades especiais, cirurgia, endodontia e periodontia especializada. Alguns também estão habilitados para a instalação de próteses dentárias.

Principais ações da Política Nacional de Saúde Bucal – Brasil Sorridente

A estrutura da rede é bem definida: o paciente vai da atenção primária (UBS) para a secundária (CEOs). Na secundária, realiza o diagnóstico e, se necessário, é encaminhado para a terciária (Hospitais). Mas a terciária tem que responder para a primária o que fez com o paciente, e de acordo com a pesquisadora, falta esse retorno para o profissional da atenção básica, responsável por ordenar todo o processo. “Até por uma questão de recursos e vagas, a atenção básica fica responsável por esse paciente para evitar a superlotação do terciário. O maior problema que identificamos é que eles não conseguem acompanhar o paciente da forma correta. Ele é encaminhado e o centro de especialidade deveria enviar um retorno. Não estava havendo essa conversa”, afirmou Lopes, que ainda que sem uma resposta dos CEOs e do terciário, os dentistas das UBSs não conseguem fazer o acompanhamento de forma efetiva.

Uma continuação desse estudo, idealizada por Mariana e ainda em curso, propõem-se a analisar a influência de um profissional da saúde da família nessa dinâmica. Responsável por uma região, esse profissional fica encarregado de acompanhamentos periódicos mais próximos da população ao seu entorno, dando atenção diferenciada para casos mais graves como os de câncer de boca. Os resultados, até então, mostram-se positivos. “Nas equipes com o dentista da saúde da família, eles conseguem fazer melhor o acompanhamento dos pacientes que recebem o diagnóstico, ou a suspeita, de câncer de boca porque eles fazem ações mais próximas da população”, conta.

Outro ponto importante é a prevenção. No Brasil, o Estado de São Paulo é pioneiro na campanha de prevenção ao câncer de boca. Ela acontece junto à campanha de vacinação do idoso, grupo de risco para o desenvolvimento da patologia, e já existe há cerca de 15 anos. O idoso vacinado passa por um dentista que faz a análise dos tecidos moles da boca e, caso note alguma alteração, o encaminha para os centros de especialidades. O Ministério de Saúde organiza também a “Semana Nacional de Prevenção do Câncer Bucal”, sempre na primeira semana de novembro.

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