Projeto da USP leva próteses dentárias para populações isoladas da Amazônia

Versão moldada com plástico especial é feita sob medida para indígenas e ribeirinhos da região

Modelo de prótese removível feita a partir do composto plástico polipropileno [Imagem: Amanda Capuano]

A perda dentária é um problema que afeta grande parte da população brasileira. Pensando nisso, um projeto idealizado por Roberto Stegun, professor da Faculdade de Odontologia da Universidade de São Paulo (FOUSP), busca levar próteses de baixo custo e fácil implantação para populações indígenas e ribeirinhas na região da amazônia. O grupo já esteve no Xingu e no Baixo Madeira, e retornará ao último em julho para a produção e instalação de novas unidades.

O projeto surgiu da necessidade de repor dentes perdidos por populações isoladas. Até por essa razão, ao contrário das próteses convencionais que têm camadas metálicas e costumam ser caras e trabalhosas Stegun leva versões de polipropileno, um material plástico de baixo custo e fácil manufatura. “Nesses projetos sociais não tem como levar a estrutura de um laboratório inteiro para a fundição de uma prótese comum. Nesse caso, preciso carregar apenas um aparelho pequeno e uma prensa, e ter uma tomada no local”, conta ele. “Ela tem seus prós e contras, como a padrão ouro, mas com esse material a gente consegue confeccionar no local e não tem que deslocar a população para uma cidade grande”, explica o pesquisador, que considera ainda que a operação nas localidades facilita o acompanhamento dos pacientes.

Prótese comum com base de metal. Modelo tradicional é mais caro e de difícil confecção [Imagem: Amanda Capuano]

A primeira expedição ocorreu em 2017, no Xingu. O objetivo era fazer um levantamento da necessidade de reposição de dentes e da faixa etária de atuação. “Quando a gente chegou, deu para perceber que com 15 anos já há uma perda dental. Então, colocamos a faixa inicial de avaliação a partir dessa idade porque a perda de dentes permanentes desregula toda a boca”, conta ele. A proposta era voltar às tribos posteriormente para a confecção e implantação das próteses, além da capacitação de profissionais da região. No entanto, devido a burocracias, o projeto ainda não foi para frente.

Mas a iniciativa não parou por aí, e recebeu o apoio de veteranos da região. “O do Xingu não saiu e conheci uma ONG chamada Doutores sem Fronteiras. Eles atuam na população do Baixo Madeira, em Rondônia, e me convidaram para conhecer. Fomos em 2017 e fizemos um levantamento com a população ribeirinha”, conta o professor. A sondagem foi feita no Lago do Cuniã. Segundo Stegun, para chegar até lá é necessária uma viagem de 12 horas rio abaixo, saindo de Porto Velho.

O grupo voltou ao local em 2018 e produziu e implantou 14 próteses ao longo dos 10 dias em que esteve na comunidade. Para aproveitar a viagem, fizeram ainda um levantamento na tribo indígena Paiter Suruí, para onde retornarão entre os dias 8 e 25 de julho deste ano. Nós vamos em dez. A nossa vontade é fazer 30 próteses, mas vai ser a primeira vez que vamos aplicá-las em índios e são procedimentos que eles não estão acostumados. Então, a gente precisa saber como eles vão reagir”, conta o pesquisador, que banca as viagens com recursos próprios, além de patrocínios e doações, devido à dificuldade burocrática de conseguir apoio público.

O equipamento e o polipropileno são cedidos por uma empresa parceira. O gesso e o alginato, insumos necessários para a confecção, chegam a partir de doações conseguidas pela ONG. Depois da confecção das próteses, o material é descartado na floresta como fertilizante para a terra. “Não vou lá para poluir. Descobrimos que o gesso e o alginato, que é um material à base de algas, poderiam servir de adubo. Então, a gente leva tudo isso e depois distribui na floresta. É só esfarelar e jogar na terra”, relata.

Polipropileno utilizado na confecção das próteses. Material é derretido e preenche molde bucal [Imagem: Amanda Capuano]

A motivação do professor é nobre: compartilhar os conhecimentos desenvolvidos na Universidade para além de seus muros. “O acesso é difícil e o que me motiva a fazer isso é que essa população não tem acesso aos trabalhos que estamos desenvolvendo aqui na USP. Não é um material novo, já existe no mercado. Estamos apenas adequando para que possa ser utilizado nessa população”, conclui Stegun.

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