Desintegração econômica e política é tendência entre os novos governos de direita sul-americanos

Em março, presidente Bolsonaro se reúne com lideranças sul-americanas para selar a criação do Prosul, novo bloco econômico com a cara da nova direita. Créditos: MARTIN BERNETTI / AFP

Com a vitória de Jair Bolsonaro nas eleições brasileiras de 2018, consolidou-se de vez a guinada da América do Sul à direita. Se no início dos anos 2000 a esquerda era hegemonia na região, hoje o polo político oposto governa, além do Brasil, Argentina, Chile, Peru, Colômbia e Paraguai. Na avaliação do professor de ciências políticas Rafael Villa, a desintegração é a característica mais visível de tais governos.

Especializado na política externa latino-americana, o professor da USP aponta características que compõem a recente e intencional perda de unidade entre os países da região. Além da polarização política, outro fator central está no enfraquecimento do Mercosul. “No plano econômico, o processo de desintegração do Mercosul está praticamente consumado, já que o desejo de quase todos esses governos é assinar um tratado de livre comércio com os Estados Unidos”, diz ele, ressaltando que o alinhamento ao presidente americano Donald Trump não é exclusividade brasileira.

Sai Unasul, entra Prosul

No dia 22 de março, os presidentes do Brasil, Argentina, Chile, Peru, Colômbia, Paraguai e Equador assinaram o documento que cria o Prosul (Fórum para o Progresso da América do Sul). Apesar do discurso contra o multilateralismo, os líderes desses países criaram um novo bloco, que substitui a extinta Unasul (União das Nações Sul-Americanas), acusada por de ser de esquerda. Realizada no Chile, a cerimônia que formalizou o bloco contou também com a presença de Uruguai e Bolívia, que figuraram como países observadores. A Venezuela não foi convidada.

O fator Venezuela

Outro aspecto que desidratou a esquerda da região, principalmente a brasileira, foi a crise venezuelana. Os abusos do regime político da Venezuela foram escolhidos como principal fonte de críticas aos governos de esquerda nos últimos anos, o que é frequentemente justificado pelo apoio que tais governos teriam dado aos presidentes Hugo Chávez e Nicolás Maduro. No Brasil, essa visão foi vastamente explorada durante a campanha de Bolsonaro contra o PT. Perguntado se durante os governos petistas a política externa brasileira foi contaminada pelo bolivarianismo, Rafael é categórico: “não, de forma alguma”. Ao contrário do que esse senso comum diz, o professor aponta que na verdade o Itamaraty foi em certa medida blindado por uma conduta pragmática, tanto no governo de Lula quanto de Dilma. 

“O finado presidente venezuelano Hugo Chávez fez várias propostas para a América do Sul que o Brasil não aceitou. Isso aconteceu, por exemplo, com o chamado oleoduto do Sul”, exemplifica o professor, se referindo ao projeto de um canal que se estenderia da Venezuela até a Patagônia. “Na época, o Brasil, que era governado por Lula, não aceitou. O governo brasileiro também divergiu do venezuelano quando este propôs a criação do Banco do Sul. Além disso, houve a ideia de se criar, do ponto de vista militar, uma espécie de Otan sul-americana, ou seja, uma espécie de exército internacional dos países sul-americanos. Em todos esses casos o Brasil foi contra”. 

No entanto, o professor pondera que o apoio ao regime venezuelano existe por parte de membros do Partido dos Trabalhadores. “Claro que havia uma certa solidariedade e apoio político aos governos de Hugo Chávez. Houve e continua a existir”, ele afirma, ressaltando, porém,  que este apoio não alterou o histórico de condutas do Ministérios das Relações Exteriores.

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