Depressão na gravidez impacta no peso e no Índice de Apgar de recém-nascidos

Estudo realizado no Hospital das Clínicas da USP revela as influências e consequências da doença no período gestacional

Pesquisa também notou relação do diagnóstico com questões sociodemográficas. (Foto: Piepie - Pixabay)

A depressão não faz distinção entre sexo, raça ou classe social. Apesar de ser um assunto em alta e já terem inúmeros estudos abordando a sua gravidade, ela ainda não é tratada com o cuidado, respeito e compreensão que requer. O assunto permanece sendo um tabu tanto para se falar quanto para lidar. 

No período da gravidez isso tende a se agravar, já que no imaginário social este é um momento em que a mãe deve estar feliz. Durante a depressão na gestação, a mulher deixa de cuidar da sua saúde, implicando em riscos para o bebê e para ela mesma, além de apresentar sintomas comuns aos de qualquer pessoa depressiva, como desânimo, ansiedade, tristeza intensa, dentre outros.

Em estudo realizado no Hospital das Clínicas, a psicóloga Jéssica Gorrão Lopes Albertini, sob orientação da professora Gláucia Rosana Guerra Benute, constatou em sua tese de mestrado fatores que se relacionam ao quadro depressivo na gravidez e como isso afeta o desenvolvimento do feto.

A ideia

Albertini afirma que a chegada ao tema esteve relacionada com a sua iniciação científica, realizada durante a graduação. Naquele período, ela estudou a respeito da depressão em crianças com idade escolar. Apesar disso, quando veio para São Paulo iniciar o mestrado, a sua ideia inicial era fazer um aprimoramento profissional para psicólogos em hospital geral, mas ainda não era algo bem definido.

Com a alocação na área da obstetrícia, a mestranda passou ter mais contato com gestantes. A partir de então, com a orientação de Benute, houve uma refinação até chegar ao tema da pesquisa. “O disparador principal foram os estudos anteriores de prevalência de depressão na população de gestantes, em sua grande maioria, de alto risco, considerando que a gente estava em um hospital terciário. Então, queríamos saber como seria isso, se a prevalência seria maior ou não, e quais seriam os impactos”. Complementa, a pesquisadora.

Pesquisadora Jéssica Albertini. (Foto: arquivo pessoal)

Os reflexos da depressão nos recém-nascidos

Intitulada de “Avaliação de depressão em gestantes e associação com desfechos de parto e nascimento”, a tese foi em boa parte retrospectiva, ou seja, se baseou em dados passados retirados de prontuários de atendimentos psicológicos desde 2002. De acordo com a psicóloga, “o objetivo era investigar a prevalência da depressão no período gestacional, independente do período em que a gestante estava e, a partir disso, fazer um levantamento sobre quais as patologias, doenças e fatores sociodemográficos mais estavam associados ao diagnóstico na gravidez.” 

Após a coleta de dados, passou-se então a buscar a relação com os desfechos do parto e do nascimento de cada paciente. “A gente tentou investigar se ter depressão estava associado à idade gestacional do nascimento em semanas, à prematuridade, ao tipo de parto (normal ou cesárea), a adequação do peso do recém-nascido e também o Índice de Apgar [que mede a vitalidade da criança assim que nasce] e como foi a condição que os bebês nasceram.”

A pesquisa contou com 760 participantes no total, dessas 20,76% apresentaram o diagnóstico, as quais 64,4% estavam em uma gravidez de alto risco. Para Jéssica, os principais pontos constatados na pesquisa foram o baixo peso — bebês vindos de mães depressivas apresentaram cerca de 180 gramas a menos do que aqueles de mulheres que não apresentaram depressão durante a gestação — e o Índice de Apgar, que também se mostrou inferior em bebês cujas mães apresentaram o diagnóstico. Neste caso, a variação foi três vezes menor.

Fatores sociodemográficos

A tese de mestrado também apontou que questões sociais e até financeiras apresentaram relação com o quadro. A depressão esteve mais presente em mães que não tinham parceiros presentes ao longo do período. O mesmo foi constatado naquelas que não possuíam atividade remunerada.

Para Albertini “isso ampliou o olhar tanto sobre propostas internas quanto de políticas públicas para acompanhar essas gestantes, considerando que elas teriam um prejuízo, caso convivessem com esse diagnóstico sem tratamento durante a gravidez, e quais estratégias poderiam ser utilizadas para ajudá-las.”

A saúde foi outro fator que a pesquisa revelou impactante. A maioria das voluntárias já tinham doenças que representavam algum risco para o feto, como diabetes, hipertensão ou cardiopatia congênita. 

A rede pública de saúde pode ajudar

Ciente da limitação de pessoal dentro do Sistema Único de Saúde (SUS), a psicóloga acredita que a proposta para acolher essas mulheres vai ao encontro ao que já é executado dentro do Hospital das Clínicas. No início do pré-natal há uma triagem para identificar se existem sintomas de depressão. Uma vez diagnosticada, a mãe é acompanhada com psicoterapia convencional e avaliação psiquiátrica.

Para Jéssica, esse acompanhamento pode ir além. “Esse atendimento poderia ser aprimorado ao se trabalhar com grupos, já que isso permitiria atingir um número maior de gestantes. Tendo esse espaço, elas poderiam compartilhar as suas vivências gestacionais para dizerem como elas se sentem sobre isso, inclusive, os sentimentos negativos.”

Além de aumentar o número de mulheres atendidas, a terapia em grupo poderia mitigar os efeitos da depressão durante a gestação até o pós-parto. Afinal, a gravidez já é um período peculiar e cuidar da saúde mental é importante.

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