Reino Unido proíbe fracking e reabre debate sobre danos ambientais

Geólogo da USP explica que grande número de poços criados com prática aumentam riscos à sociedade

Desde implantação, poços não convencionais geram descontentamento na Inglaterra. (Imagem: ABS-CBN)

Fraturamento hídrico, fracking em inglês, é a aplicação de fluidos em alta pressão no intuito de extrair gás e petróleo represados em rochas pouco permeáveis, chamadas folhelhos. Popularmente, essas estruturas são conhecidas como xistos betuminosos. O combustível fóssil é expelido prontamente, já que fica confinado. Assim, os poços de extração não convencional se espalham rapidamente e podem gerar uma série de constrangimentos aos seus vizinhos.

Na Inglaterra, o fracking literalmente estremeceu a vida dos moradores. Terremotos de até 2,9 graus na escala Richter foram sentidos por habitantes de Great Plumpton, Blackpool e Lythan St. Annes. Análise pedida pela Oil and Gas Authority apontou que a prática tem efeitos imprevisíveis ao meio ambiente e à população. Além disso, moradores da região dos tremores se mobilizaram por 1.032 dias até a decisão do governo conservador interromper a extração de petróleo via fraturamento, que ocorreu no começo de novembro.

O professor Ricardo Hirata, do Instituto de Geociências (IGc) da USP, explica que como os poços de fraturamento hídrico se esgotam em pouco tempo, a extração exige uma grande quantidade de perfurações para haver viabilidade econômica. Na Inglaterra, seriam necessários mais de 6 mil poços para o investimento valer a pena, segundo o relatório da Oil and Gas Authority.

Iniciado um poço de petróleo e gás, os transtornos à população são comuns, informa o geólogo. Grandes caminhões, barulho, poluição tornam-se cotidianos. Ele esclarece que tremores são comuns em qualquer obra de grande porte. “Em barragens, os abalos sísmicos podem chegar a magnitude 5”, conta. Como a escala richter é logarítmica, seria um terremoto mais de 100 vezes mais forte. No entanto, incapaz de causar fatalidades.

Hirata, que é especialista em águas subterrâneas, ainda alerta sobre os riscos de contaminação de aquíferos. De acordo com ele, entre 5% e 10% das perfurações tem vazamentos, normalmente de pequenas quantidades. Só que o fracking demanda uma alta densidade de poços. “Logo, o número de vazamentos aumenta”, declara. Como a exploração não convencional acontece em grandes profundidades, há o perigo de desastres ambientais passarem despercebidos.

Apesar do Partido Conservador ter cedido na decisão, seus membros deram sinais que poderiam retomar o fracking, caso ganhem as eleições gerais de dezembro. Os documentos que determinam a moratória sobre a prática, deixam brechas para reabertura da exploração, na cobertura de alguns pré-requisitos. Trabalhistas, Liberal Democratas, Verdes, defendem que o fraturamento hídrico deve ser banido de uma vez por todas.

Estados Unidos fraturaram o mundo

Em 2014, dada a crise do petróleo, o governo norte-americano começou a exploração via fracking. Aberto o campo de Marcellus, nos EUA, o país se tornou o maior produtor de barris de petróleo do mundo — posto tradicionalmente da Arábia Saudita. Desde então, tudo mudou no mercado de combustíveis fósseis.

Grandes reservas de petróleo não eram exploradas por causa do risco da prática. (Imagem: Não Fracking Brasil)

Segundo a ONG Down to Earth, EUA, Canadá e China são os países que mais praticam fraturamento hídrico. Hirata conta que depois do pontapé inicial da gestão Obama, outros países foram incentivados a abrir campos de fracking, em busca de espaço no comércio de combustíveis fósseis.

Outros países já proibiram a prática em razão de seus riscos. Na União Europeia, Irlanda, França, Alemanha e Bulgária já baniram o fracking em seus territórios. “Não sou terminantemente contra”, declara Hirata. Entretanto, o geólogo explica que faltam estudos para permitir que fraturamento hídrico ocorra com a segurança ambiental adequada.

O presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, no começo de 2019, declarou que dedicaria uma área na Califórnia com cerca de 400 mil hectares para extração de combustíveis fósseis via fracking.

Após a reviravolta no Reino Unido, o governador do estado, Gavin Newson, decretou novas regulações sobre a prática, na última terça-feira (19). Qualquer escavação de poço requerirá um estudo de impacto, sob pena de moratória. Além disso, ficam proibidos na proximidade de casas, hospitais, escolas e parques.

Resistência ao fracking já ocorre no Brasil

Entidades da sociedade civil pressionam setor público e privado contra fraturamento. (Imagem: Não Fracking Brasil)

De acordo com a ONG Não Fracking Brasil, 380 municípios já baniram a prática. Em Santa Catarina, o licenciamento ambiental do fraturamento hídrico é proibido, desde julho deste ano, pelo projeto de lei (PL) 145/2019.

Grande parte das rochas pouco permeáveis que contém combustíveis fósseis está na Bacia do Paraná. O governador paranaense Ratinho Júnior sancionou uma lei proibindo o fracking no estado, também em julho. Depois, a Agência Nacional do Petróleo acionou a justiça questionando a constitucionalidade da lei estadual 19.878.

O projeto é dos deputados Evandro Araújo (PSC), Cristina Silvestri (PPS), Goura (PDT), Marcio Pacheco (PDT). Eles defendem que o fraturamento hídrico coloca a produção agrícola paranaense em risco, uma vez que pode contaminar águas subterrâneas.

Ricardo Hirata já redigiu uma nota pública a respeito do Fracking. A exploração não convencional de gás e petróleo ainda é debatida em comissões do Senado Federal.

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