A vacinação e a proteção da propriedade intelectual durante a reta final do governo Trump

Enquanto Biden se prepara para assumir a presidência, Trump anuncia a aprovação da Moderna

Fotomontagem sobre imagens Freepik

Com a mais recente aprovação da vacina Moderna nos Estados Unidos e a provável aprovação da Pfizer, o país caminha para o início das vacinações, enquanto ainda bate recordes no número de casos. Enquanto isso, o presidente Donald Trump agora se mostra favorável a imunizar sua nação, e apenas ela. Iniciativas têm surgido, como a Covax Facility, visando uma colaboração global para acelerar o desenvolvimento e acesso aos testes, tratamentos e vacinas para a doença e garantir que nenhuma nação saia mais prejudicada da crise. Contudo, os Estados Unidos aparentemente não se unirão a eles. Até que Joe Biden assuma a presidência, no próximo dia 20, a nação deve manter as medidas de segurança adotadas e torcer para que a distribuição das vacinas ocorra rapidamente. 

O internacionalista João Paulo Hernandes Teodoro destaca que a política comercial da administração Trump é ‘radicalmente diferente’ da praticada pelos três presidentes que o antecederam. “Clinton, Bush, e Obama contribuíram para uma expansão das relações comerciais dos EUA nos níveis multilateral, regional e bilateral”, explica o autor da tese de doutorado “A negociação e implementação de direitos de propriedade intelectual em acordos preferenciais de comércio: uma análise dos papéis do Congresso e de grupos de interesse dos Estados Unidos (1995 – 2012)”, que estuda os governos dos respectivos anos e compara com a situação atual do país e do mundo.

Donald Trump, Melania Trump, Barack Obama, Michelle Obama, Bill Clinton, Hillary Clinton no funeral do ex-presidente George Bush, em 2018 – Foto: Andrea Hanks/ Fotos Públicas

Enquanto Clinton garantiu a participação dos EUA na Organização Mundial do Comércio (OMC), Bush e Obama estenderam uma rede de acordos e projetos comerciais, o segundo deles envolvendo até a União Europeia (UE). “Esses presidentes entendiam o comércio internacional como um criador de oportunidades econômicas para o país. Trump, por sua vez, vê o comércio internacional como um empecilho à economia, sobretudo o proveniente do México e da China.” 

A posição do presidente americano parece variar de acordo com a vacina que aparentar mais promissora. Quando a vacina alemã do laboratório CureVac estava mostrando sinais positivos, o presidente tentou comprar a empresa. Posteriormente, quando as vacinas americanas apontaram resultados positivos, o presidente aparentou ter outro objetivo: o patenteamento. 

“Caso essas vacinas venham de fato a ser patenteadas, elas podem ser inacessíveis para as camadas mais pobres das populações de muitos países, e mesmo para sistemas nacionais de saúde”, afirma Teodoro. Contudo, ele pontua que seria possível resolver a situação e que companhias farmacêuticas podem ampliar o acesso às vacinas, por meio de iniciativas de compartilhamento, como a mencionada Covax.  

É preciso levar em conta que “a patente é um instrumento que visa assegurar que seus investimentos em pesquisa sejam recuperados através de um monopólio garantido pelo estado”, explica o pesquisador. “Por isso, os produtos vendidos durante a validade da patente, em torno de 20 anos, têm um custo bastante elevado em relação ao de produtos genéricos.”

As relações comerciais de Trump 

Bandeira da OMC – Foto: WTO/ Instagram

A OMC possui padrões estabelecidos vinculados à liberalização comercial. A organização, criada por meio do Acordo TRIPS, auxilia os países no acesso a novos mercados, condicionados à proteção às patentes e a outras formas de proteção à propriedade intelectual. “Países de participação expressiva no comércio internacional exigem a inclusão de direitos de propriedade intelectual em acordos de comércio. Além disso, a garantia de proteção a direitos de propriedade intelectual pode ser vista por empresas transnacionais como um incentivo a investimentos.”

Sobre sua tese, Teodoro conta que observou que desde 1995, data da criação da OMC e dos primeiros documentos analisados em seu trabalho, “os EUA têm defendido um sistema comercial justo, que deve ser acompanhado de direitos de propriedade intelectual adequados”. Ele também ressalta que o país considera a contrafação, ou “pirataria”, uma distorção de comércio.

Nos registros analisados datados a partir 2001, ele observou que países em desenvolvimento, o Brasil incluso, defendiam “um sistema internacional de propriedade intelectual que equilibrasse a justa recompensa à inovação com a proteção a outros valores sociais”. Resultados concretos disso foram a emenda TRIPS ao acordo da OMC e a criação de um mecanismo internacional que disponibiliza produtos farmacêuticos a baixo custo para países em situações de emergência ou de capacidade farmacêutica insuficiente ou inexistente. 

Em paralelo a essas negociações, Teodoro analisou que os EUA negociaram acordos preferenciais de comércio que visavam oferecer mais mercados às exportações estadunidenses e difundir seus padrões de propriedade intelectual. Esses, incluem direitos de propriedade intelectual mais específicos e rigorosos do que aqueles gerenciados pela OMC.

Até a atualidade, Trump também não demonstrou receio em criticar a Organização, como ocorrido em setembro, após um conflito tarifário de bens chineses. Apesar dos desentendimentos do atual presidente com as organizações mundiais, acredita-se que em 2021 Joe Biden adotará uma postura mais ponderada e menos extrema.

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