UM PASSEIO ENTRE LIVROS E LEITORES

[por Sofia Calabria]

“Falam que as pessoas não estão comprando mais livros. Mentira”. Foi o que me disse a estudante de fotografia Cristiane Lima que, junto de seu companheiro, estava saindo da Festa do ano passado, ambos com sacolas nas duas mãos, quando os abordei. Mas engana-se quem pensa que estavam indo embora. Os dois estavam levando os livros ao carro para voltarem para uma segunda leva. Ela já havia visitado o evento antes, ele pela primeira vez. Pelo visto a experiência foi boa. “Achei excelente. Andei só um pouco e já achei bastante coisa.”, disse o analista de sistemas Cleber Ferreira. Sábado foi o dia escolhido pelo casal por ser o único possível. Eles vieram atrás de catálogos de fotografia, mas claro que se depararam com boas surpresas que não estavam na lista. Que sorte a Festa ter estreado no final de semana! E neste ano, continua.

De fato, era gente que não acabava mais. Enquanto andava, perdi a conta de quantas malas de rodinhas e carrinhos de feira vi passando por mim. Eu tinha é que tomar cuidado com os pés! Avistei uma delas, vermelha, já cheia, cuja dona examinava livros infantis. Pelo visto ela não queria se desviar muito da sua missão. “É rapidinho?” Por fim, falou comigo, depois eu garantir que sim. “Vim na Festa passada e gostei muito. Dá pra conhecer editoras diferentes, que você não encontra tão fácil”, me contou a economista Luciana Pazini. Ela me disse que a mala cheia eram livros que estava comprando para doar a duas creches e também alguns para dar a seus sobrinhos. Perguntei se ela veio pra passar o dia. “Não, to com o horário contado. Vou levar as crianças ao teatro hoje, então reservei duas horinhas do dia pra isso (risos)”. Então entendi porque os minutos conversados tinham que ser poucos!

Com o olho atrás da lente da câmera, à procura de cliques, é bem mais fácil notar os detalhes. É gente conversando com o vendedor sobre aquele livro que chamou a atenção, pessoas indecisas sobre quais dos exemplares que têm em cada mão levar (“por que não os dois?”), crianças curiosíssimas folheando páginas coloridas cheias de ilustrações, editoras conversando entre si. Entre crianças, adultos e idosos, havia perfis de leitores para todas as editoras nas três grandes tendas.

Muitas vezes eu tive que me esgueirar entre os corredores, desviar de braços, sacolas e pessoas concentradas demais vendo livros, além de ficar na ponta dos pés pra fugir desta ou daquela cabeça para conseguir tirar uma foto legal. Andando pela ala verde, perto de onde estava a Edusp, vi um livro lindo, e fui conversar com uma das moças atrás do estande. Era a editora Attie, dedicada à filosofia árabe e que participava da Festa pela quarta vez. Cristiane Damien, um das responsáveis pelos processos de produção da editora, me disse que aquele livro, tirando a impressão, era todo artesanal. Era um exemplar da nova série Codex, todo encadernado manualmente. “Como a gente trata de filosofia árabe, e o tema é bastante desconhecido do público, aqui não somente se vendem livros, mas trocamos ideias com as pessoas. São pessoas que gostam muito do mundo árabe e querem saber sobre ele. A gente consegue ter um retorno do nosso trabalho, porque muitas pessoas voltam pra saber das novidades. A cada edição é uma nova boa surpresa”, comenta Cristiane.

 

Chegando à tenda azul, me deparei com uma obra, toda em azul claro e branco e fui folheá-la. Era História de Uma Linha, da editora Quatro Cantos. “A autora faz uma brincadeira em relação à linha como elemento essencial. Essa linha escapa do caderno do menino, ganha o mundo e a cada virada de página ela vai se transformando em uma coisa diferente. É uma metáfora de liberdade, de irreverência”, disse Rosana Martinelli, sócia-proprietária da editora e também autora de alguns títulos, que expunha na Festa pela quinta vez. Ela comentou que todo ano aguardam ansiosamente pelo evento e ressaltou a receptividade do público. “Rende excelentes conversas. É acima de tudo um prazer, um público muito bacana, disposto à troca”. Enquanto conversávamos, o verdadeiro público-alvo da editora estava lá, com os pais, xeretando. “Existem crianças que chegam no estande, abraçam um livro e não soltam. Como autores, a gente só acredita que aquele livro é real quando ele está na mão de uma criança e ela lê, porque ele está cumprindo sua função. Quando ele tá parado ele não é nada. Às vezes os pais postam suas crianças lendo nossos livro, nas redes sociais, e é extremamente emocionante, eu não consigo deixar de chorar nenhuma vez (risos). Você vê na voz da criança aquele texto, é o livro tomando vida”, completa.

E aí, quais serão as histórias que você vai contar da Festa do Livro deste ano?

[2018] SÁBADO PELA PRIMEIRA VEZ

Pela primeira vez a Festa do Livro da USP acontece também no sábado! Pra quem não conseguia participar de jeito nenhum nos anos anteriores, esta é a chance! Se você já veio nos outros dias e quer repetir a dose no fim de semana, livro nunca é demais! Mas temos mudanças importantes no sábado, então é bom se programar:

HORÁRIOS – Diferente de quarta, quinta e sexta, no sábado a Festa termina mais cedo, às 19h.

CAMINHO – Você só poderá entrar pela Portaria 1 da USP, no cruzamento da Av. Afrânio Peixoto com a Rua Alvarenga. Dentro da USP, a Av. Prof. Mello Moraes (a rua da Raia Olímpica) vai estar toda bloqueada: o caminho precisará ser feito pela Av. da Universidade e não vai ser possível entrar e sair da Festa pelo Espaço Laranja.



Quem conhece a Festa, sabe que ela costuma estar sempre muito, muito cheia. Pode ser que sábado ela fique ainda mais, então não deixe para a última hora!

[2018] UM APERITIVO DA FESTA

A Festa está chegando!

E você, já sabe um pouco do que vem por aí? São mais de 230 editoras neste ano pra você conhecer ou rever e, claro, milhares de títulos para escolher. A Festa é um momento de troca importante entre editoras e público, porque permite o contato direto entre ambos. Muitas vezes é possível conversar com o próprio editor, bater um papo sobre o perfil da editora, sobre aquele título que te chamou a atenção. Legal, né? Que tal ver destaque de algumas editoras?

Uma delas é a Dublinense, que se dedica a literatura contemporânea, humanidades e artes. Ela traz “O Alegre Canto da Perdiz”, da escritora moçambicana e referência em literatura feminina do país, Paulina Chiziane. O livro fala sobre as questões de Delfina como mulher negra e sua liberdade, sempre sufocada. “O leitor pode ter uma reflexão profunda sobre a questão racial a partir da perspectiva da mulher africana, produzida por uma autora pioneira e em seu país e, por sorte, no idioma original, o português de Moçambique”, diz o editor da Dublinense, Gustavo Faraon. A editora apresenta também “Ética e Pós-Verdade”, escrito por grandes nomes: Christian Dunker, Cristovão Tezza, Julián Fuks, Marcia Tiburi e Vladimir Safatle. “Quem busca uma visão crítica e mais complexa sobre um dos termos do momento, “pós-verdade”, vai encontrar abordagens distintas, a partir da psicanálise, literatura, filosofia e política, pensadas por grandes intelectuais brasileiros”, comenta Faraon.

“O alegre canto da perdiz”, de Paulina Chiziane.

Já a Solaris traz para o público obras com ilustrações raras sobre aspectos históricos do Brasil. A série Lembranças, que tem entre seus títulos “Lembranças do Brasil: As Capitais Brasileiras” e “Lembranças de São Paulo: O Litoral Paulista”, apresenta uma iconografia de cartões postais que datam entre 1895 e 1960, muitos deles pertencentes a colecionadores e estudiosos. Cada livro tem cerca de 500 ilustrações temáticas e que podem interessar a públicos de diversas faixas etárias. “A intenção é perpetuar valiosos acervos que de outro jeito não estariam disponíveis ao público, quase como um museu de papel, já que muitas das imagens correspondem a peças raras, únicas. O Brasil possui uma história muito rica, com acervos que conservam boa parte dela, e é necessário produzir obras que a perpetuem e sirvam de fonte de consulta permanente”, diz o editor da Solaris, Carlos Cornejo.

“Lembranças do Brasil: As Capitais Brasileiras”, de João Emilio Gerodetti e Carlos Cornejo.

A biografia de um dos maiores representantes da antropologia, “Lévi-Strauss”, é lançada pelas Edições Sesc. A obra, da historiadora francesa Emmanuelle Loyer, traz documentos inéditos do antropólogo e perpassa por toda sua vida, desde a infância até seu falecimento, em 2009. Com base em depoimentos, documentos reunidos no Brasil, Estados Unidos e Europa, e nas fichas do acervo pessoal do antropólogo, a autora traça a trajetória de Strauss e a formação de seu pensamento. Pinturas, bronzes e tecidos são alguns dos exemplos do que se encontra no título “China: Uma História em Objetos”, da inglesa Jessica Harrisson-Hall. O livro percorre os mais de 7 mil anos de história chinesa a partir de artefatos como roupas, joias e mobiliário, desde o período Neolítico até hoje. “Nosso catálogo se pauta pelas áreas referentes à cultura num sentido amplo, da filosofia ao teatro; da arquitetura à questão indígena; da sociologia às artes visuais entre outras. Em tempos tão sombrios para a cultura de maneira geral e, não por acaso, em particular para o mercado editorial, expor nossas publicações nesta feira é mesmo motivo de festa”, comenta a editora das Edições Sesc, Isabel Alexandre.

“Lévi-Strauss”, de Emmanuelle Loyer.

E não poderia faltar a Edusp, idealizadora da Festa do Livro. Completando a série “História da América Latina”, organizada por Leslie Bethell, o volume X, “A América Latina após 1930: Argentina, Uruguai, Paraguai e Brasil”, discute a experiência histórica de cinco séculos da América Latina. Os leitores que, além de história, se interessam por literatura russa, vão poder ver a influência dela no Brasil na obra “Dostoiévski na Rua do Ouvidor: A Literatura Russa e o Estado Novo”, em que Bruno Barretto Gomide faz uma análise da circulação dos autores russos no País e quais suas influências nas decisões políticas e nos ritmos da história e da cultura durante a Era Vargas. O autor fala também sobre o que era ler tais literaturas em um período autoritário.

“Dostoiévski na Rua do Ouvidor: A Literatura Russa e o Estado Novo”, de Bruno Barretto Gomide.

“São obras importantes em suas áreas de conhecimento e mostram a diversidade da nossa produção editorial, como o volume final de uma das coleções mais relevantes da editora, e a análise da recepção de um dos maiores escritores do século XIX no Brasil”, diz a diretora editorial da Edusp, Cristiane Silvestrin. O que mais será que você vai descobrir de fantástico nesta Festa?