Combinados

No DDD buscamos construir um espaço de aprendizagem em que todos possam se sentir seguros para compartilhar experiências e sentimentos, que favoreça a construção coletiva de conhecimento, e que não reproduza discriminações. Conforme bell hooks (2020, p. 49), é importante criar uma sala de aula “onde estar inteiro é bem-vindo” e onde os estudantes “podem nomear os medos, expor sua resistência a pensar, expressar-se e honrar os momentos em que tudo se conecta e o aprendizado coletivo acontece”. 

Esse ambiente de aprendizagem não é um estado final ou um destino, mas um processo contínuo que deve ser construído de forma coletiva ao longo de todos os encontros (KISFALVI e OLIVER, 2015). Segundo bell hooks (2013 e 2020), é fundamental já no início das aulas criar as bases para a construção do que ela chama de uma “comunidade de aprendizagem”. É essencial abrir espaço para que professores e estudantes possam conhecer uns aos outros e vislumbrar como podem aprender juntos, isto é, como vão estabelecer um “relacionamento mútuo que alimente o crescimento de ambas as partes, criando uma atmosfera de confiança e compromisso” (HOOKS, 2020, p. 51).

A partir desses pressupostos pedagógicos, o Núcleo DDD realiza no início do ano uma dinâmica para construção de combinados para o grupo. Em um primeiro momento, pedimos que todos indiquem valores que consideram importantes para o grupo, como respeito, autonomia, alegria, afeto, apoio, criatividade, entre outros. Em seguida, pedimos que todos indiquem combinados que considerem necessários para que esses valores sejam respeitados. O objetivo é que os combinados favoreçam um ambiente de aprendizagem ao mesmo tempo desafiador, que motive a investigação, a curiosidade, a compreensão de diferentes perspectivas, e o desenvolvimento pessoal; e acolhedor, que permita o acolhimento de erros, discordâncias e diferenças com respeito, sem que ninguém se sinta inferiorizado ou humilhado. 

Dean Spade (2012, p. 189-190) aponta que a construção de combinados para a participação em sala de aula é fundamental para transformar o clima competitivo e individualista das faculdades de Direito. Segundo ele, precisamos construir uma cultura de sala de aula que se afaste explicitamente desses valores, e enfatize outros, como colaboração, coletividade e auto-reflexão. Destacamos alguns exemplos de combinados possíveis de serem realizados em sala de aula, com base em Dean Spade (2012) e nas práticas do Núcleo de Direito, Discriminação e Diversidade: 

  1. Telefone sem fio: tente sempre se referir a algo que foi dito pela pessoa que falou antes de você para que todos/as se sintam ouvidos/as.
  2. Nome e pronome:  memorizar os nomes, pronunciá-los corretamente e não pressupor o pronome de alguém até que revele sua identidade de gênero.
  3. Colaboração, não competição: todos/as são responsáveis pelo aprendizado e devem colaborar para o aprimoramento das aulas e para que ninguém fique para trás.
  4. Fura fila: quem falou menos durante um debate tem direito de furar a fila quando quiser expor sua opinião. 
  5. Para frente/para trás: quem tem facilidade para falar deve dar espaço para aqueles que participam menos. Quem tem mais dificuldade deve tentar se colocar mais, para contribuir para a construção coletiva do conhecimento.
  6. Crítica construtiva: começar com o positivo, ser específico, se referir a comportamentos que podem ser mudados, oferecer alternativas, deixar claro que é a sua percepção e entender que a pessoa pode não concordar.
  7. Las vegas/carnaval: o compartilhamento de experiências pessoais deve permanecer restrito ao grupo; o que acontece no DDD fica no DDD. 
  8. Cuidado com referências e vocabulário: não assumir que todos possuem as mesmas referências e não usar “argumento de autoridade” sem a devida explicação.

Ainda que sejam feitos combinados, é importante reconhecer que haverá limitações dos acordos de grupo e condições estruturais que podem os enfraquecer, lembrando que os alunos possuem poder de escolha para transformar um contexto que muitas vezes parece sufocante e enfraquecedor (SPADE, 2012, p. 190). Além disso, os combinados precisam ser constantemente revistos a partir das características dos novos integrantes dos grupos e de suas necessidades, além dos projetos e atividades que serão realizadas a cada semestre.